Imagem extraída do primeiro episódio de "First Person" : "Mr. Debt"
Em quatro dias vi as duas temporadas da série "First Person" (2000), realizada pelo célebre documentarista norte-americano Errol Morris (oscarizado pelo seu "The Fog of War"). Isto é, em menos de uma semana, passaram-me pelos olhos cerca de 17 histórias de vida sobre crimes, taras, obsessões incuráveis, actos de heroísmo ou simplesmente o inexplicável.
Apesar de não parecer, o conceito por detrás de "First Person" é simples: fazendo uso de uma invenção de sua autoria, o Intertron (já lá vamos), Morris colocou em frente à câmara, a cada episódio, uma pessoa com uma história invulgar, se não mesmo única, para contar. Todas as entrevistas são feitas face-a-face, entre o entrevistado e a câmara, que por sua vez é o entrevistador (o próprio Morris) e nós, espectadores. Perceberam? Eu explico de novo: Intertron é uma máquina de filmar com uma função similar ao teleponto num telejornal, mas em vez de texto, o entrevistado vê directamente a imagem do entrevistador. Para Morris, esta sua geringonça iria deixar mais à vontade o entrevistado, que, dessa forma, não se sentia intimidado pela câmara - ela é o próprio Morris - ou pelo entrevistador - Morris é a câmara.
Trata-se de uma solução engenhosa que, no entanto, condiciona, por vezes em demasia, as opções formais existentes em "First Person": pontualmente, sentimos uma certa tontura, devido aos separadores pretos e às imagens de arquivo (reais ou de filmes antigos) que intercalam as entrevistas e também por causa da frontalidade, sempre agressiva, com que estas nos são dadas a ver. Durante 30, 40 minutos, às vezes uma hora, somos confrontados, olhos nos olhos, com as mais mirabolantes histórias de pessoas de carne e osso, mas que podiam ser produtos de uma qualquer ficção tresloucada: desde um senhor de idade respeitável que sonha ver, um dia, uma lula gigante ("Eyeball to Eyeball"), até um homem que esconde algures, num frigorífico, a cabeça da sua mãe ("I Dismember Mam"), passando pela estranha mulher que tem uma especial propensão para se envolver emocionalmente com os piores serial killers ("The Killer Inside Me").
Trata-se de uma solução engenhosa que, no entanto, condiciona, por vezes em demasia, as opções formais existentes em "First Person": pontualmente, sentimos uma certa tontura, devido aos separadores pretos e às imagens de arquivo (reais ou de filmes antigos) que intercalam as entrevistas e também por causa da frontalidade, sempre agressiva, com que estas nos são dadas a ver. Durante 30, 40 minutos, às vezes uma hora, somos confrontados, olhos nos olhos, com as mais mirabolantes histórias de pessoas de carne e osso, mas que podiam ser produtos de uma qualquer ficção tresloucada: desde um senhor de idade respeitável que sonha ver, um dia, uma lula gigante ("Eyeball to Eyeball"), até um homem que esconde algures, num frigorífico, a cabeça da sua mãe ("I Dismember Mam"), passando pela estranha mulher que tem uma especial propensão para se envolver emocionalmente com os piores serial killers ("The Killer Inside Me").
E isto só na primeira temporada: "Mr. Personality", entrevista a um homem sobredotado, ex-concorrente no "Quem Quer Ser Milionário" e que reviveu o liceu várias vezes, sob identidades falsas; "Leaving the Eart", a história de um homem que procurou aterrar um avião destinado a despenhar-se; e "The Smartest Man in the World" ( ver o episódio na integra nas janelas abaixo), reflexões de um segurança de bar com um q.i. superior a Einstein e Darwin, são episódios que marcam a segunda temporada desta cativante série documental, que, para desgosto de Morris, foi interrompida por razões financeiras.
Morris trata todas estas pessoas com o mesmo respeito, atenção e interesse que revelou em "The Fog of War" no contacto com Steve McNamara: esta sua capacidade quase camaleónica de se adaptar a entrevistados tão diversos parece advir, em certo sentido, de uma curiosidade insaciável pelas estranhas formas que a natureza humana pode tomar. Do seu interesse pelos outcasts da sociedade (génios,autistas, homicidas, burlões, viciados, sonhadores), Morris julga poder aproximar-se das respostas para alguns dos maiores enigmas da humanidade: o mal, a morte, o universo e o futuro. Apesar de nos entusiasmarem, as histórias de "First Person" parecem ficar aquém de objectivos tão ambiciosos: não raras vezes, sentimos mais a exploração do fait-divers do que a pretendida indagação sobre a condição humana. De qualquer modo, o simples arrojo da proposta vale, só por si, uma visita.
Morris trata todas estas pessoas com o mesmo respeito, atenção e interesse que revelou em "The Fog of War" no contacto com Steve McNamara: esta sua capacidade quase camaleónica de se adaptar a entrevistados tão diversos parece advir, em certo sentido, de uma curiosidade insaciável pelas estranhas formas que a natureza humana pode tomar. Do seu interesse pelos outcasts da sociedade (génios,autistas, homicidas, burlões, viciados, sonhadores), Morris julga poder aproximar-se das respostas para alguns dos maiores enigmas da humanidade: o mal, a morte, o universo e o futuro. Apesar de nos entusiasmarem, as histórias de "First Person" parecem ficar aquém de objectivos tão ambiciosos: não raras vezes, sentimos mais a exploração do fait-divers do que a pretendida indagação sobre a condição humana. De qualquer modo, o simples arrojo da proposta vale, só por si, uma visita.
"The Smartest Man in the World" (episódio 6 da segunda temporada de "First Person") - Parte I
"The Smartest Man in the World" (episódio 6 da segunda temporada de "First Person") - Parte II
"The Smartest Man in the World" (episódio 6 da segunda temporada de "First Person") - Parte III
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