Apesar do actor Hippolyte Girardot aparecer como co-realizador, não tenho dúvidas que "Yuki & Nina" é um filme De Nobuhiro Suwa -- até porque é, estética e tematicamente, um filme, para todos os efeitos, muito mais "Oriental". Isto é, temos uma narrativa sobre os afectos entre as paredes de uma casa familiar típica dos nossos tempos: um casal e uma criança. Ele é francês, ela é natural do Japão. A filha, Yuki, divide-se entre os dois, sobretudo, quando a separação se afigura inevitável.
A forma como Suwa constrói a tensão doméstica é magistral - já o era em "M/Other" -, porquanto a sua câmara é apropriada pelo espaço onde filma. Suwa explora as divisões (rupturas arquitectónicas equivalem a rupturas afectivas? Ozu não diria que não) como princípio da relação entre as personagens, mas acima de tudo consegue ver nas pequenas rotinas todo o potencial dramático necessário para imergir o espectador na história, ou melhor, "familiarizá-lo" - verbo certeiro - com a casa, com a família, com os seus conflitos interiores, os seus silêncios e "explosões/implosões" à mesa. Tudo, por norma, num único plano, que leva ao limite a co-habitação com os actores no tempo e no espaço.
A forma como Suwa constrói a tensão doméstica é magistral - já o era em "M/Other" -, porquanto a sua câmara é apropriada pelo espaço onde filma. Suwa explora as divisões (rupturas arquitectónicas equivalem a rupturas afectivas? Ozu não diria que não) como princípio da relação entre as personagens, mas acima de tudo consegue ver nas pequenas rotinas todo o potencial dramático necessário para imergir o espectador na história, ou melhor, "familiarizá-lo" - verbo certeiro - com a casa, com a família, com os seus conflitos interiores, os seus silêncios e "explosões/implosões" à mesa. Tudo, por norma, num único plano, que leva ao limite a co-habitação com os actores no tempo e no espaço.
Já em "2 Duo" e "M/Other" a mesa é o local por excelência de todos os exorcismos emocionais. Em "Yuki & Nina" a irritação do casal é mais explícita quando os vemos a almoçar à mesa com a sua filha Yuki, que assiste ao desmoronar do casamento dos pais. Ia escrever que Yuki assiste "passiva" à discussão dos pais à mesa, mas não estaria a ser exacto, porque é precisamente na ausência de palavras, em cada gesto onde esta parece descobrir uma evasão forçada do ambiente que a rodeia, que a interpretação de Yuki ganha (ainda) mais força. Ela age sobre o espectador com enorme violência quando é testemunha, muda, das zangas dos pais ou, por exemplo, quando serve de tubo de escape emocional para os adultos, que ela e Nina (a sua melhor amiga francesa) têm dificuldade de entender.
Veja-se, a título de exemplo, a magnífica - uma das melhores deste ano - sequência da leitura da carta por parte da mãe e a forma como esta desaba emocionalmente à frente da filha e esta, pela sua linguagem corporal, comunica a sensação de deslocamento que lhe invadirá o espírito ou as deambulações pela floresta mágica, que transportam Yuki de uma realidade (França) para outra (o sereno e fantasmático Japão, filmado à imagem de um Mizoguchi contemporâneo) ou, enfim, da Realidade para o conto fantasista em jeito de fábula antiga do Oriente - os silêncios, as pequenas conversas, dominam esta história plena de gravitação emocional e imbuída de um lirismo tão gradual, tão fino, que acaba por passar quase imperceptível. Delicadeza, arte e magia. Tudo o que o cinema deve ser. Obra-prima.
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