O "The Thing" de Nyby, produzido por Hawks, é diferente do "The Thing" de Carpenter nalguns aspectos curiosos. Neste sci-fi de terror o "alien", espécie de vegetal sobredesenvolvido que vem perturbar os trabalhos de um grupo de exploradores norte-americanos, é usado como permanente "antecipação" do perigo. Isto é, o medo é gerado, sobretudo, na ausência da sua imagem. No fabuloso remake de Carpenter, o "alien" é frontalmente encarado pela câmara e só se torna verdadeiramente perigoso quando se instala no organismo dos protagonistas, virando-os uns contra os outros - situação clássica em Carpenter, como nalguns Hawks (exemplo de "Red River"). A imagem do inimigo vai-se confundindo progressivamente com a imagem do homem, mesmo do melhor dos homens.
Este jogo perverso está invertido no original: o "bicho" vai-se distinguindo cada vez mais da "forma" e, acima de tudo, do "conteúdo" humanos. Claro que a curiosidade e tensão que desperta vão lançar alguma discórdia entre os membros da comunidade humana, mas aqui o "bicho" é só um assunto, isto é, não se substitui materialmente aos protagonistas; não faz com que o próprio espectador se perca na acção, sem referências de "bem e mal". A perversidade de Carpenter é, obviamente, mais moderna, mas não nos iludamos: o clássico de Nyby-Hawks mantém uma frescura notável, tendo suscitado em mim outra ordem de evocações. Pensei mais em Shyamalan, e no seu "Signs", quando vi o "bicho", pela primeira vez, de corpo inteiro, já havia passado mais de meia hora de filme.
Apenas o vemos de relance, numa porta que se abre (as portas que se abrem... muito carpenterianas...), isto é, a primeira imagem do "bicho" é um flash de horror, como que mediado pela fronteira da porta, como o extraterrestre no filme de Shyamalan é-nos dado a ver, pela primeira vez, de corpo inteiro, num breaking news televisivo. Partilhamos, na qualidade de espectadores da televisão e da porta que se abre, duas janelas "virtuais" abertas pelo cinema - sobremediação... quem a controla? -, digo, somos levados a partilhar a exclamação muda de horror que abala o espírito das personagens. E o espírito é colectivo, e poderá ser medium, numa obra de terror desta natureza.
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