domingo, 20 de abril de 2008

Kiss Me Deadly (1955) de Robert Aldrich

"Kiss Me Deadly" é um film noir muito especial. Percebemos isso logo nos primeiros minutos, em que vemos uma mulher semi-nua a correr desesperada, ao longo de uma estrada. Os carros passam, ignorando-a... até que esta decide colocar-se à frente do carro daquele que irá ser o protagonista do filme: Mike Hammer (Ralph Meeker). Os minutos seguintes são decisivos: "remember me", diz a mulher a Hammer, segundos antes desta morrer e ele ficar ferido, e amnésico, na sequência de um desastre de viação com muito pouco de acidental...

A partir daqui, é noir puro: Hammer inicia uma investigação particular, começa a ligar variadíssimos nomes (o enredo é difícil de seguir, como um "The Big Sleep" ou "Murder, My Sweet") e, entrementes, seduz várias mulheres, algumas loiras (venenosas?) e uma morena (aquela que verdadeiramente ama). O mais especial nesta obra-prima de Robert Aldrich é, para além da sua extrema negridão e violência (a lembrar, a espaços, esse autêntico mergulho no abismo que é "Nightmare Alley", filme maldito de Edmund Goulding), a forma como paulatinamente vai perdendo o contacto com a realidade, deixando que a paranóia se apodere da história como um vírus.

Perto do fim, "Kiss Me Deadly" desliza para uma espécie de vertigem horrífica, só comparável a um David Lynch, mais concretamente, ao seu noir revisionista, "Mulholland Drive" - o que esconde a caixa misteriosa a que todos querem deitar mão?

Aldrich filma este noir febril e demencial, seguindo um objectivo claro: a cada plano, uma obra de arte. Com a câmara em posições inauditas, a sublinhar permanentemente a estranheza da história-pesadelo de Hammer, Aldrich constrói uma teia de imagens plasticamente notáveis e engenhosas. Singular.

Ler mais aqui: IMDB e DVDTimes.

1 comentário:

Adriano Miranda-Franca-SP disse...

KISS ME DEADLY ( A Morte num Beijo / EUA; 1955 ), é uma obra-prima do " film noir " norte-americano. O filme é considerado pelo historiador de cinema A.C. Gomes de Mattos , " o último dos grandes filmes noirs puros " e nada deve aos clássicos absolutos do gênero ( The Maltese Falcon, The Postman Always Rings Twice, Laura, Detour, The Big Sleep , entre outros ). O diretor Robert Aldrich foi buscar no autor mais desprezado da ficção policial hard-boiled que inspirou as películas do gênero - Mickey Spillane- o material para essa obra-prima e recheou a história com as tensões da Guerra Fria, a sordidez da sociedade capitalista e o legado miserável da humanidade. Como disse muito bem o crítico de cinema Luís Carlos Merten, ao se referir à exibição do filme na TV paga , toda a truculência do personagem Mike Hammer torna-se ninharia com o desfecho da trama, quando a " caixa de Pandora " disputada pelos personagens ( à maneira do falcão maltês do filme de John Huston ) se revela um artefato bélico atômico- e tudo o mais perde o sentido.
Contrariando a opinião de muitos, o detetive Mike Hammer foi brilhantemente vivido por Ralph Meeker, que conseguiu tornar o personagem crível, humanizando-o para além dos clichês do investigador particular dos filmes noir. Meeker em KISS ME DEADLY e Dana Andrews em LAURA ( no papel do detetive Mark McPherson ) talvez tenham sido os dois únicos atores a compor com perfeição e sem a afetação direta dos clichês , os melhores detetives do film noir. É claro que Humphrey Bogart criou um tipo antológico, mas é difícil separar o Sam Spade de THE MALTESE FALCON , do Philip Marlowe de THE BIG SLEEP- ambos parecem ser o mesmo, apesar do primeiro ser personagem de Dashiell Hammett e o segundo de Raymond Chandler !
Por várias razões, é preciso colocar KISS ME DEADLY no topo da produção do film noir, como um dos mais representativos exemplares desse " gênero ", além de reabilitar Ralph Meeker como um grande ator, que ofereceu no filme de Aldrich, uma atuação perfeita e , portanto, impecável e definitiva de Mike Hammer.
( Adriano Miranda-Franca-SP- Professor e Historiador de Cinema )

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