segunda-feira, 29 de abril de 2013

Balanço IndieLisboa 2013: Top 5 da blogosfera cinéfila


Em termos puramente cinematográficos, este IndieLisboa 2013 ofereceu variedade, em quantidade e, algumas vezes, em qualidade. Comparando com o ano anterior, a título pessoal, não posso dizer que tenha feito melhores escolhas e, pelo que conversei com algumas pessoas, fica no ar a sensação de que a programação de 2012 contou com momentos de cinema que não foram superados este ano. De facto, excluindo obviamente os filmes repostos (sobretudo a obra-prima de Tod Browning/Lon Chaney, "The Unknown", ou as melhores curtas de Kubelka, como "Adebar" e "Unsere Afrikareise"), não tivemos este ano um filme como "Everybody in Our Family", obra de Radu Jude que conseguiu reunir o consenso entre os bloggers cinéfilos que convoquei na altura para a elaboração de um Top 5. Apesar disso, e continuo a falar a título pessoal, registei essa importante descoberta chamada "Museum Hours" e as confirmações - previsíveis, é certo, mas efectivas - de "Before Midnight" e "Frances Ha".

Comparando com a média de classificações do ano passado, que (como sempre) vou atribuindo no fórum Peeping Tom, dentro de uma escala de 0 a 5, parece haver um ligeiro decréscimo este ano: de uma média de 2,5 passamos para uma média de 2,2. Não posso dizer, ainda assim, que o balanço seja muito negativo ou até negativo - acredito até que o facto de ter falhado os visionamentos de obras como "The Act of Killing", "Leones", "Lacrau" e outros explicará, em certa medida, esta relativa infelicidade da minha parte.

Assim sendo, reeditando o que fiz no final do IndieLisboa 2012, convoquei diferentes bloggers cinéfilos, que cobriram de perto o evento, para escolherem os seus "5 mais". Publico, já de seguida, o Top conjunto, seguido dos Tops individuais do CINEdrio (meu), do Rick's Cinema (de Aníbal Santiago), do Keyzer Soze's Place (de Samuel Andrade), do Shut up and watch the movies (de Pedro Fernandes) e, last but not the least, do À pala de Walsh (de João Lameira).

Top blogosfera cinéfila IndieLisboa 2013

1. "Museum Hours" de Jem Cohen
2. "Leviathan" de Lucien Castaing-Taylor e Véréna Paravel
3. "Leones" de Jazmín López
4. "The Act of Killing" de Joshua Oppenheimer
5. "Frances Ha" de Noah Baumbach

Nota: seguindo rigorosamente a jurisprudência instituída com o Top de 2012, "Leviathan" surge isolado no segundo lugar, por ter reunido três votos distintos, ainda que totalize os mesmos 8 valores de "Leones" e "The Act of Killing". Também decidi "isolar" "Leones": é verdade que totaliza 8 pontos, mas é inequivocamente escolhido por um dos dois votantes como o melhor filme do festival, distinção que "The Act of Killing" nunca chega a obter, sendo "medalha de prata" nesses dois Tops. 

Top CINEdrio

1. "Museum Hours" de Jem Cohen
2. "Before Midnight" de Richard Linklater
3. "Frances Ha" de Noah Baumbach
4. "Gimme the Loot" de Adam Leon
5. "Antíphon" de Peter Kubelka

Top Rick's Cinema

1. "Under African Skies" de Joe Berlinger
2. "The Act of Killing" de Joshua Oppenheimer
3. "Leones" de Jazmín López
4. "No" de Pablo Larraín
5. "La piscina" de Carlos Quintela

Top Keyzer Soze's Place 

1. "Leones" de Jazmín López
2. "Sinapupunan"/"Thy Womb" de Brillante Mendoza
3. "Art Will Save the World" de Niall MacCann
4. "Leviathan" de Lucien Castaing-Taylor e Véréna Paravel
5. "Public Hearing" de James N. Kienitz Wilkins

Top Shut up and watch the movies

1. "Museum Hours" de Jem Cohen
2. "The Act of Killing" de Joshua Oppenheimer
3. "Leviathan" de Lucien Castaing-Taylor e Véréna Paravel
4. "Gimme the Loot" de Adam Leon
5. "Starlet" de Sean Baker

Top À pala de Walsh 

1. Trilogia Paradies de Ulrich Seidl
2. "Frances Ha" de Noah Baumbach
3. "Leviathan" de Lucien Castaing-Taylor e Véréna Paravel
4. "Ma belle gosse" de Shalimar Preuss
5. "Public Hearing" de James N. Kienitz Wilkins

Aqui estão, um ano volvido, mais várias mãos cheias de bom cinema, que as distribuidoras, editoras e televisões portuguesas poderão apontar como prioridades para este ano de 2013.

Frances Ha (2013) de Noah Baumbach


Aqui está um gesto livre de cinema. Livre de quê? De tudo aquilo que, por norma, nos afasta das personagens e do seu mundo ou que, por sistema, procura afirmar uma marca autoral, de realizador, em detrimento da procura de uma justa medida, que é, como é sabido, a medida de todas as coisas, a medida, enfim, da nossa vida. "Frances Ha" é um trabalho de uma simplicidade desarmante, nesse aspecto: uma actriz, a belíssima Greta Gerwig, e o seu alter ego, a doce, desajeitada, clownesca Frances. A Nova Iorque a preto-e-branco de Baumbach, próxima de um Woody Allen, dá a atmosfera certa a este pedaço de slapstick contemporâneo, com todos os moods terrenos que nos temperam a vida. O mais belo no filme é a sua fluência e essa tal aragem de liberdade que encontramos no melhor cinema indie norte-americano.

O exemplo mais sublime de como Baumbach nos sabe oferecer, com a colaboração de uma actriz irresistível, esta visita deliciosa a uma vida aparentemente "sem história" é a sequência musical ao som de Bowie, onde vemos a bailarina Frances a correr dançando e a dançar correndo pelas ruas de Nova Iorque. Este momento lembra, obviamente, Denis Lavant em "Mauvais sang", mas a leveza de espírito e os "bons sentimentos" imperam neste filme ou não seria Frances a personagem mais happy-go-lucky (não, não estou a citar o insípido filme de Mike Leigh) que podíamos encontrar: sem lamento ou choros miúdos, Frances diz que está bem e é feliz, mesmo quando todo o mundo parece conspirar para tornar a sua vida "inconsertável" (o termo mais usado é "undatable", mas o que Frances precisa é de um outro arranjo cósmico, que faça jus à sua "boa onda" e saudável jovialidade).

Frances acaba por ser o lado b de Greenberg, personagem do filme anterior de Baumbach onde Greta Gerwig também entra, interpretando uma personagem não muito distante desta Frances. Em vez de optar pela reclusão e passar o tempo a "azedar" nas suas frustrações, Frances mexe-se, sai de casa, muda-se para outra casa, encontra-se com este amigo ou com aquele conhecido, visita a sua melhor amiga (a única verdadeira e autêntica história de amor em todo o filme) ou simplesmente baila e faz girar, num redemoinho airoso e alegre, tudo o que a rodeia.

("Frances Ha" foi exibido hoje, dia 28, na secção Observatório. Magnífico filme que, caras distribuidoras, mais do que merece ser mostrado ao grande público. JÁ!)

Paradies: Hoffnung (2013) de Ulrich Seidl


A conclusão da trilogia "Paraíso" de Ulrich Seidl faz-se com a história da "filha" no primeiro filme, "Paradise: Love". A "tia", de "Paradise: Faith", leva Melanie para um "fat camp", onde esta encontrará rapazes e raparigas iguais a si, todos eles sofrendo de excesso de peso, problemas de insegurança e, sobretudo ou talvez apenas, atravessando a proverbial crise da adolescência que ataca todos os "teens", sejam eles gordos ou magros, bonitos ou feios, austríacos ou norte-americanos. Melanie vai encontrar amizade e compreensão junto de algumas raparigas (sobretudo uma, a que se gaba mais das suas conquistas amorosas ou sentimentais), mas, antes de tudo, é neste "campus" que a nossa protagonista descobre o amor: o médico de serviço, homem com idade para ser seu pai (por falar nisso, cadê o pai de Melanie? Cadê as figuras paternas no cinema de Seidl?). Não se tenha dúvidas de que há um certo "horror ao pai" nestas histórias de mulheres à deriva pelos seus sentimentos, umas contrariando os seus impulsos amorosos, outras os seus impulsos de fé ou sexuais (coisas que se confundem em "Faith", de facto).

Em "Paradise: Hope", o esquematismo moral seidliano não é tão óbvio e as suas personagens (sobretudo a adolescente) têm margem para ganharem algum volume dramático para lá da sua aparência imediata, que em registos anteriores seria paroxistica e grotescamente objectificada pela câmara do perverso realizados austríaco. Estamos no terreno identificável, palpável, "real" da adolescência e é nele que se constrói uma história de incomunicabilidade, estranheza e, de um modo particular é certo, amor. A caricatura viva que é o "senhor doutor", bicho estranho que se vai revelando nos seus jogos pervertidos quase invisíveis, está sempre ali para nos lembrarmos de que isto é um "film von Seidl", mas ao menos há margem aqui para alguém existir - e daí que talvez, pela primeira vez na trilogia, a palavra no subtítulo não seja cinicamente atraiçoada ou convenientemente explorada. 

("Paradise: Hope" passou hoje, dia 28, na secção Observatório. Não faz de Seidl nem da sua trilogia lugares de passagem obrigatória. De qualquer modo, há uma visão que se desenvolve coerentemente ao longo destes três "paraísos" que, tendo seduzido boa parte ou a parte boa da crítica e do público deste IndieLisboa, talvez merecessem alguma forma de distribuição em Portugal. Por exemplo, uma caixa de DVDs.)

domingo, 28 de abril de 2013

Vencedores IndieLisboa 2013


Este ano, o prémio máximo do IndieLisboa, para melhor longa-metragem internacional, foi para "Leviathan", filme documental realizador por Lucien Castaing-Taylor e Véréna Paravel que tive oportunidade de analisar aqui. Outros importantes premiados: "Lacrau" (melhor longa portuguesa e prémio Árvore da Vida), "Amsterdam Stories USA" (prémio do público para melhor longa) e "Má Raça" (prémio Novo Talento FNAC e menção honrosa no prémio de melhor curta nacional). O palmarés final pode ser consultado aqui.

The Unknown (1927) de Tod Browning


Filme mudo de Tod Browning protagonizado por Lon Chaney, na pele de Alonzo, o "homem sem braços", e com uma ainda muito jovem Joan Crawford, dando corpo (corpo completo) a Nanon, a sua assistente no espectáculo de circo. Filme sobre impotência e castração masculinas que usa uma linguagem "de mãos" para simbolizar a incapacidade do "freak maneta" de conquistar o coração dessa jovem deslumbrante. Esta queixa-se da forma como os homens lhe "põem as mãos em cima", exaspera com os assédios impertinentes de Malabar, o homem de braços indestrutíveis, capaz de dobrar ferro com uma "perna atrás das costas". Bem, chega de insistir nos segundos sentidos: "The Unknown" é uma brutal fábula sobre a relação do corpo com a comunicação, ou melhor, sobre a relação do corpo com o amor.

A insistência de Nanon no horror que as mãos de Malabar lhe causam, na primeira parte do filme, antecede a fetichização erótica que esta acabará por fazer dessa parte do corpo masculino, no final do filme. Entre um gesto e outro, entre o ódio e o amor, a repulsa e atracção, a história de Alonzo vai sendo jogada por um Tod Browning requintadamente malvado. A sequência em que Alonzo se apercebe do erro monumental que cometeu - que não posso revelar aqui - ficará nos anais da história do cinema como uma das mais impressivas composições dramáticas realizadas por um actor. A cara de Chaney rebenta num riso diabólico para depois "cair em si", num abismo psicológico de onde nunca mais conseguirá sair - quem conseguiria sair? Na sala, ouvi também risos histéricos, mas houve outrossim - logo a seguir - o silêncio mais angustiado. "The Unknown" é, então, um filme sobre mutilações, incompletudes, impotências insanáveis que partem do corpo para depois atacarem, a frio, o coração mais quente.

("The Unknown" foi exibido hoje, dia 28, na Cinemateca Portuguesa, dentro da secção Director's Cut do IndieLisboa. É um dos clássicos habituais na programação da casa-mãe do cinema, por isso, se não o viu, aguarde por nova reposição.)

Before Midnight (2013) de Richard Linklater


O reencontro com Jesse e Celine passados (quase) dez anos é um reencontro connosco quando tínhamos menos dez anos. Na realidade, podemos recuar mais um pouco e sermos levados aqui a uma viagem agridoce, com o seu quê de nostálgica, até aos anos da adolescência durante os quais se poderá ter, acidentalmente, cruzado com esta história de amor. Comigo foi assim e, como acredito que há filmes que fazem mais sentido quando são "achados" - o termo é esse - em determinados momentos da nossa vida, devo dizer que preservo carinhosamente a memória desse encontro: o deles e o meu com eles. Não regressei a "Before Sunrise", também não regressei à noite em que vi pela primeira e última vez "Before Sunset", precisamente em dia de abertura de um festival de cinema chamado IndieLisboa. Lembram-se? Não? Não estavam lá? Mas estiveram lá hoje? Se sim, se não, a mensagem de "Before Midnight" ultrapassa barreiras cinéfilas e entra no domínio do absoluto ou do absolutamente nada que é a vida - mas que maravilhoso "absolutamente nada"!

No almoço - único instante em que senti a encenação e a escrita, destoando com a fluência e espontaneidade do resto do filme -, uma senhora mais velha toma a palavra, após se percorreram pequenas histórias de vida contadas por cada um dos presentes, dos mais novos aos do meio, sempre com o anfitrião, um veterano escritor grego, como pivô da amena conversação. Ela diz que a vida passa como o sol que se põe, depois esta ideia de efemeridade associada aos ritmos do dia (elo de ligação dos três títulos da trilogia) é posta em prática por Celine que vai repetindo "ainda está", "ainda está", "ainda está", à medida que o sol desaparece no horizonte. Não vê o "raio verde", mas o feitiço é quase tão encantador como em Rohmer. (Já vos disse, esta trilogia não é cinema - ou não é, lamento imenso usar este advérbio, "apenas" cinema - para mim, mas sim, antes de mais, um pedaço da minha vida. Por isso, não esperem nestas linhas uma crítica "muito razoável" ao filme, que, de qualquer dos modos, me parece ser "objectivamente" notável.)

Estamos na Grécia, destino que será - tinha de ser! - o mais doloroso dos três - o próprio contexto político não ficará esquecido. O casal vive junto, com duas filhas, mas carrega consigo os sonhos românticos de quando eram jovens turistas em Viena a par de pequenos grandes acidentes de percurso que os separaram temporariamente entre o "nascer do sol" e o "pôr do sol". Entramos no princípio da noite das suas vidas, cada um na casa dos quarenta anos, cada um igual a si mesmo, divagando na conversa do outro, fazendo da caminhada pelo espaço uma metáfora dessa dimensão transitória (quase turística) da nossa passagem pela vida e das palavras, arrancadas frescas do seu íntimo, "imagens" de um passeio infinito e eternamente sedutor pelas diversas "faces (ia escrever fases, mas recuei) do amor". As influências estão intactas: Rohmer, em primeiro lugar, mas também, porque a saga já vai longa, Truffaut e o seu Antoine Doinel. A relação aqui é, contudo, "a três" (Delpy - Linklater - Hawke) ou "a quatro" se nos juntarmos nós, espectadores enfeitiçados na juventude pelo coup de coeur que uniou para sempre aqueles dois jovens sonhadores, que agora crescem, encantam-se e desencantam-se connosco (e como nós). Está visto: é um maravilhoso reencontro e é de novo a engolir em seco que nos despedimos deles... Pelo menos, por agora.

("Before Midnight" passou hoje, dia 28, na secção Observatório. O filme terá estreia comercial em Portugal. E é absolutamente imperdível.)

sábado, 27 de abril de 2013

O futuro da Cinemateca: que direcção?


A situação actual da Cinemateca Portuguesa é alarmante e deixa antever um futuro nada risonho para esta instituição que se tem dedicado, de corpo e alma, à "educação do olhar" de sucessivas gerações de cinéfilos. No mês de Maio, cuja programação já está online, os ciclos temáticos ou por autores ficaram reduzidos ao mínimo, um mínimo, aliás,  garantido por apoios exógenos à Cinemateca. Se antes, a direcção e programadores haviam conseguido "disfarçar" o estado real da instituição, agora, o mal está à vista, numa programação "sem âncoras" que já nem impressa condignamente é, tanto em quantidade quanto em qualidade.

O sinal foi dado no texto que abre a programação e que deve ser lido por todos aqueles que se preocupam pela preservação da memória cinéfila e cinematográfica deste nosso país. Agora a pergunta que se coloca - à sociedade civil, está claro - é: o que fazer? Criação de um movimento de protesto, de uma petição pública? Relembro que não há muito tempo, sob a mesma direcção da Cinemateca, foi criado um movimento e que desse movimento resultou uma manifestação e que dessa manifestação... bem, está visto, pouco ou nada resultou. Desde aí, já tivemos uma mudança governamental e, pelas minhas contas, dois secretários de Estado da Cultura. Se calhar, para começar, importa evitar diabolizações fáceis e dar espaço, sem tabus, a todos os diagnósticos e hipóteses de acção.

Pergunto-me se não deveria entrar de vez na "agenda" uma questão decerto pouco cómoda, se calhar muito incómoda dado já estarmos fatalmente sob o efeito deste processo de degenerescência que assola uma instituição dedicada a dar vida aos mortos e aos fantasmas no ecrã. Essa questão é: estará esta direcção preparada para gerir um eventual movimento cívico que reconduza, com estrondo, todos estes problemas a quem de direito? Neste momento, terá esta direcção, sobretudo a presente directora, capacidade ou margem política para sair da sua zona de conforto e se aliar a esta causa, que é a nossa causa, mas também deve ser, antes de mais, a SUA causa? Que margem existe para fazermos alguma coisa, que produza de facto as consequências desejadas?

Entenda-se: estou a falar explicitamente do problema de um eventual - sublinho o eventual - deficit de liderança (ou daquilo que os ingleses chamam leverage) dentro da Cinemateca Portuguesa. Se está em causa o futuro da Cinemateca tal como a conhecemos, então temos de colocar todas as questões. Eu, pessoalmente, tenho horror à passividade, aos meios-termos e à lenta podridão... Gostava de agir - e irei agir, espero - mas pergunto-me se estaremos todos empenhados da mesma maneira (isto é, incondicionalmente) em inverter uma situação que, como utente e amigo da Cinemateca Portuguesa, muito seriamente me preocupa.

À conversa com o realizador de "Leviathan" (I)


A primeira parte da agradável conversa que tive com o realizador-peixe de "Leviathan", Lucien Castaing-Taylor, já foi publicada aqui ao lado, no À pala de Walsh.

Les carabiniers (1963) de Jean-Luc Godard


Lançado no mesmo ano de "Le petit soldat" e "Le mépris", "Les carabiniers" deverá ser um dos filmes menos amados/vistos do período mais glorioso de Jean-Luc Godard. A primeira razão possível para este relativo obscurecimento será, obviamente, a sua proximidade temporal com essa explosão de cor e erotismo que é "Le mépris". Outra razão pode ser o facto de "Les carabiniers" investir num discurso alegórico menos  imediatamente "afrontador" que um "Le petit soldat", não lhe valendo sequer a marca de "filme-escândalo". Apesar de tudo isto, a sua encenação de uma guerra imaginária, numa França imaginária (não se chama Alphaville, isso é certo), parece antecipar as bases do discurso anti-bélico de um "Pierrot le fou". Todo o filme apresenta-se contaminado, audiovisualmente, por uma atmosfera de morte e horror, não só através do entrecruzamento de "imagens filmadas" com imagens de arquivo, mas desde logo através da fetichização diabólica da carabina e daquilo que os dois protagonistas fazem com ela, sem a menor piedade. Contudo ou por isso mesmo, "Les carabiniers" é uma comédia.

Disse atrás "encenação", podia falar de teatralidade ou de dispositivos brechtianos de imagem e som que nos desconcertam pela sua ingenuidade tanto quanto nos inquietam pela sua muito directa franqueza. Os episódios dos fuzilamentos ou dos apunhalamentos de civis que passam na rua lançam o filme para o terreno do absurdo, provocando o riso ao ritmo dos tiros, das facadas e, enfim, do horror. Esta "distância" aproxima-nos então, alegoricamente, do grande objecto da "desmontagem" de Godard: a ilusão autofágica que alimenta não só aquela como todas as guerras, factuais ou factícias (atente-se aos que serão DE FACTO os anedoticamente referidos "tesouros" por que batalham os dois protagonistas, "em nome do Rei!"). Não sendo o filme politicamente mais relevante de Godard, "Les carabiniers" está investido de uma carga simbólica que sobrevive aos tempos e que nos desarma pelo riso - uma violência sem nome para um filme sobre a devastação bélica!

("Les carabiniers" foi exibido, hoje, dia 27, na Cinemateca Portuguesa. Pode encontrá-lo editado em DVD, se não quiser esperar por nova reposição.)

Un enfant de toi (2012) de Jacques Doillon


Doillon ensaia aqui uma espécie de conjugação perfeita entre o "cinema adulto" de Rivette e Rohmer e o regresso ao microcosmo infantil do seu filme mais visto e amado, o belíssimo "Ponette". Quando se aproxima desses dois grandes mestres do cinema francês, torna-se verboso e afectado, quando se reencontra ao lado da criança no filme, fá-lo de modo pálido e automático, sobretudo por comparação  com o que alcançara no filme citado. Ao mesmo tempo, estamos a falar de uma história sobre afectos, emoções, sexo e procriação que se prolonga por mais de duas horas repetindo ad nauseam as mesmas hesitações existenciais das suas personagens ou digerindo, com indisfarcável auto-comprazimento, os jogos psicológicos que vão ligando e desligando as personagens entre si, numa espécie de role playing constante, muito teatralizado, que mexe e remexe na dimensão privada daquelas figuras mas que não consegue, nem por um minuto, envolver-nos no seu mundo.

A intimidade parece ser o único tema na vida destas personagens, de tal modo que, a certa altura, sem ironia perceptível, a mulher acusa o pai da sua filha de estar sempre a falar de sexo. Até aí, importa que o leitor perceba, esta personagem não pára um segundo com os seus presunçosos jogos de sedução. Será que trabalha? Percebemos no início que sim, num museu, mas todo o filme se desenrola em registo monotemático, obcecado pela intimidade mas desastradamente avesso a qualquer forma de intimismo (ou mesmo de erotismo). "Un enfant de toi" tem para oferecer, assim, mais de duas horas em jeito de novela burguesa, que é só escrita, que se arrasta em pequenos (pequenos, não! Intermináveis!) episódios, autênticos set pieces encenados sem chama por Doillon e interpretados sem convicção pelos seus actores (salvo a doce criança, claro, que não tem culpa nenhuma).

("Un enfant de toi" passou hoje, dia 27, na secção Observatório. Volta a passar dia 28, num domingo, às 19h, no Cinema City Classic Alvalade. Uma xaropada pretensiosa que não recebe o meu aval.)

Sightseers (2012) de Ben Wheatly


"Sightseers" é bem sucedido em duas coisas: torna claro que Ben Wheatly é um embuste; torna ainda mais evidente que a estranheza de "Kill List" - a única coisa que o salvava este filme do embaraço cinematográfico - era afinal um "acidente de percurso" mal calculado. Uma comédia negra, estilo britcom, realizada de forma preguiçosa e sem personagens dignas desse nome, eis um filme que não sei o que faz no IndieLisboa 2013. Desde logo, claramente que o "alvo" deste cinema é o de outro festival da cidade, o Motelx. Por outro lado, se é financeiramente independente, poderá sê-lo, mas o gesto de realização é de completa dependência com tudo aquilo que "vende" rápido e depressa, nomeadamente a anedota idiota e boçal. O prato forte é a ironia ou não seria este um filme da "pequena Grã-Bretanha" - país que encolhe muito no grande ecrã, sobretudo quando tenta emular o que faz bem no pequeno. Mas a ironia aqui auto-ilustra-se até à exaustão como se à sua frente estivesse uma plateia que ainda se espanta, hoje, com a utilização da roda.

Um road movie que satiriza os "maus modos" até ao ponto da caricatura imbecil, "Sightseers" apenas tem um vago interesse quando explora o romance de dois "serial killers" insuspeitos, da classe média mais média que a Grã-Bretanha nos tem para dar. Os pouco imaginativos homicídios sucedem-se para depois se re-encenarem em jeito de auto-caricatura: o casal acaba por matar por razões opostas, sem moral ou qualquer filosofia própria. Este lado amoral é gerido sempre com um humor negro requentado, que culmina com o desenlace literalmente "precipitado" - se calhar Wheatly, neste ponto, já não tinha de facto mais nada a acrescentar ao vazio de ideias que acumulara durante demasiado tempo.

("Sightseers" passou hoje, dia 27, na secção Observatório. Parece que vai ter estreia comercial... fujam dela a sete pés.)

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Spring Breakers (2012) de Harmony Korine


Não se pode dizer que Korine se tenha reinventado com "Spring Breakers", até porque nele encontramos - só para citar um exemplo - um prazer que não é novo em mesclar o registo vídeo, documental, com composições estilizadas, rigorosamente encenadas (exemplo da sequência de abertura). Contudo, podemos dizer que Korine está mais sintonizado com a realidade do seu tempo neste filme e o gesto que outrora era presunçosamente arty, cheio de provocação escatológica e nihilista, ganha contornos de fábula irreverente, no limite do terrorismo audio/visual. A história de um grupo de raparigas e o seu projecto em torno de uma "spring break" que lhes fique guardada na memória para sempre vão ser o grande pretexto que Korine encontra para fazer implodir todos os clichés que minam o novo "american dream", um sonho infernal húmido, que mistura sexo, drogas, praia, muito calor, fé, Britney Spears e cor, todas do arco-iris, mas sobretudo muito cor-de-rosa.

A montagem frenética de Korine - a espaços muito inspirada, começando pelos raccords sonoros, quase godardianos, que "carregam" novas imagens como os gangsters do filme carregam as suas armas - é, na realidade, uma desmontagem desta cultura feita MTV, destituída de valores, onde, na realidade, o inferno se confunde com o paraíso, o deboche com rituais de sacristia, o pecado com a inocência obs-cena de quatro "bad girls" - not so bad at all, acrescentaria, olhando para o que as vai rodear... Numa palavra, estamos mais nos domínios de "Kids", o filme de Larry Clark com argumento do próprio Korine, do que de um "Gummo" ou "Julien Donkey-Boy".

Antes de se aventurarem na viagem das suas vidas, este bando à parte composto por quatro deliciosas "pussy rioters" - a homenagem será literalizada mais à frente... - acorda entre si viver a vida despreocupadamente, como se fosse um videojogo. A estética que se satiriza é, contudo, claramente, a da MTV, não o canal-berço do videoclipe, mas o canal que tem menos M e mais TV, menos música e mais reality show, um muito mal disfarçado soft porn para adolescentes, espécie de "Sodoma e Gomorra" onde os sonhos se confundem com fantasias e onde as fantasias se confundem com sonhos. Mas não há nada de inédito aqui, até porque podemos encontrar a mesma representação jocosa dos rituais modernos da juventude num "Piranha 3D".

De qualquer modo, em "Spring Breakers", a expressão "sonho americano" ganha um significado profundo, nem que seja por sair tantas vezes das bocas das personagens - a própria montagem exercita uma repetição convulsiva, quase enjoativa, de imagens e palavras, como se de facto não fosse possível mascarar o vazio daquele "way of life". O tal "sonho" é afagado pelo gangsta, qual pink Scarface, conhecido por "Alien", interpretado por James Franco, tanto quanto pelo seu arqui-inimigo, o ex-"best friend" (até aqui se vê o tal vazio, isto é, o tal primarismo infantil de toda esta mitologia "pop chunga") que irá "comprar uma guerra" ao nosso "herói" e às suas sereias "hard ass" - quem precisa de "guarda-costas" com um grupo destes atrás de si?

Com efeito, o novo "sonho americano", de tão mimado ou de tão minado que é, acaba por se virar contra as nossas personagens, deixando um rasto de sangue e morte atrás de si... No fundo, "nada mais" que destroços de uma viagem de finalistas que não só não correu como esperado como acabou por servir de lição às meninas. A fábula encerra, precisamente, com a promessa de um melhor comportamento futuro por parte das últimas, e mais resistentes, "little chickens" (é assim que Franco as baptiza... ao piano... algumas cenas depois de cantar uma balada lacrimejante de Britney Spears na melhor sequência de todo o filme).

Entrando no espírito, e no delírio ácido deste exercício histriónico de "desmontagem" terrorista da cultura norte-americana, "Spring Breakers" passa como um entretenimento inteligente, com algumas boas ideias de cinema lá dentro que nos distraem com sucesso de um certo excesso caricatural e de uma montagem, em certos momentos, fastidiosamente redundante. A forma muito habilidosa como Korine filma o primeiro assalto e a já citada "balada de Britney" interpretada por James Franco são as notas mais positivas e, por elas, saio de "Spring Breakers" não direi reconciliado com um cineasta que me parece sobrevalorizado, mas próximo disso.

("Spring Breakers" passou hoje, dia 26, no S. Jorge, na secção Observatório. Estreia no circuito comercial português no dia 2 de Maio. Recomendável.)

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Antíphon (2012) de Peter Kubelka


Para Peter Kubelka, a essência do cinema não é a imagem, mas a projecção da imagem. Como disse em 2005, alertando para os perigos da revolução digital, "It is the most catastrophic error of film conservators. The contents do not exist! No one has ever physically touched the content of films. The content cannot be dissociated from the material on which it is registered and, if one transfers the film on another support, one thus loses the content!". Em 1964, portanto, 41 anos antes, nas páginas da Film Culture, Kubelka participava com Jonas Mekas na análise "fotograma a fotograma" da sua própria obra para concluir: "Cinema is not movement. (...) Cinema is a projection of stills - which means images which do not move - in a very quick rhythm". Antes de chegar a esta formulação ontológica do (seu) cinema, Kubelka marcara uma posição: "Hit the screen - this is really what the frames do. The projected frames hit the screen". Dois conceitos-chave aqui, nestas duas posições separadas por mais de 40 anos: por um lado, projecção, por outro lado, ecrã.

É surpreendente a coerência deste cineasta que trabalha até ao mais infinitesimal reduto do cinema, procurando assim uma espécie de transcendência do mínimo (deleite pela ablação do cinematógrafo) que se faz mais notavelmente numa anulação do cinema pelo cinema, num desaparecimento da imagem e do som a par de uma afirmação cada vez mais palpável e ruidosa do medium. Podemos separar os seus filmes em blocos - filmes metafóricos e filmes métricos, por exemplo - mas o mais notável é a continuidade, a absoluta - regresso à palavra - coerência do trabalho que Kubelka desenvolve sobre a linguagem do medium. A sua obra começa com "Mosaik in vertrauen", uma interessante variação do estilo Free Cinema, antecipando já alguns "truques" da Nouvelle Vague, e termina - até ver - em "Antíphon". De um para outro, as mudanças são evidentes, mas quando acompanhados pela projecção do que está "entre" estes dois títulos, percebemos que não há ruptura alguma, mas sim um continuum: a posição política é a mesma, vemos sempre em Kubelka uma vontade de, pedaço a pedaço, ir salvando o cinema de si mesmo, mostrando mesmo que por muito mais que as figuras desapareçam - as de "Mosaik in vertrauen", de "Adebar", de "Dichtung und wahreit" - não só estaremos sempre perante o que se pode chamar de cinema, como na realidade estaremos mais próximos de superar a nossa, tão terrivelmente cristalizada, "ideia de cinema". Quando já não há imagens filmadas e apenas vemos o preto e o branco, apenas ouvimos som/ruído e ausência de som/ruído, estamos enfim a assistir à depuração de todo um programa estético: imagens que "atacam" o ecrã e uma projecção que se torna na verdadeira experiência, antes mesmo das imagens fixas que Kubelka dispara 24 vezes por segundo.

Aliás, esta ideia de "atacar" ou "disparar" está já muito presente na sua impressionante obra-prima de 1966, "Unsere Afrikareise", sátira anti-colonial onde imagem e som são como que urdidos em conjunto para a formulação de uma estrutura discursiva verdadeiramente explosiva. Este discurso documenta com ironia um safari de turistas europeus ao Sudão, alternando as imagens da caçada branca - ouvimos tiros, gargalhadas, vemos languidez e "poses" sobranceiras - com planos de nativos sudaneses auxiliando os estrangeiros na caçada - e sendo "forçados" a estar em pose com eles - ou seguindo naturalmente com a sua vida, à margem da aberrante expedição. São 12 minutos e 30 segundos tão significativos e "letais" quanto boa parte da obra de um Jean Rouch. Posição política que para mim não está tão longe quanto isso desta é aquela que produz a pergunta que é "Arnulf Rainer", de 1960, e, sobretudo, aquela que produz a resposta que é "Antíphon", de hoje, 2012,  52 anos depois. Já sem figuras humanas - nem sequer as silhuetas dançantes de "Adebar" ou os flashes momentâneos de vida de "Schwechater" - ou sons identificáveis, estamos aqui reduzidos a um "nada de cinema" que na realidade nos devolve, poderosamente, à experiência de estarmos numa sala, inseridos numa comunidade de espectadores e de estarmos defronte a um ecrã liso.

A resposta durou 52 anos a vir e surge-nos hoje como uma clara afirmação das qualidades mediúnicas do cinema, que neste momento - como o próprio Kubelka afirmara em 2005 - estão num processo radical de reconversão. "Antíphon" acaba por ser uma inusitada apropriação da estrutura discursiva - eminentemente musical ou não teriam algumas pessoas da plateia reagido ao filme como se estivessem num concerto de rock - de "Unsere Afrikareise", na medida em que também aqui Kubelka lida de frente com um problema de colonização, no caso, do sistema analógico pelo digital. Este regresso a "Arnulf Rainer" faz-se então quando a própria dimensão - material e rítmica - da projecção cinematográfica parece já estar em estado de ruína e o próprio cinema de Kubelka na iminência de não passar de um objecto de museu esquecido.

(Os filmes de Kubelka, que juntos duram pouco mais que uma hora, foram projectados numa sessão única, hoje, dia 24 de Abril, na Cinemateca Portuguesa. Alguns destes filmes estão disponíveis em cópias pirateadas, com péssima qualidade. Não recomendo que vejam esta obra no computador - posso comprovar que são "filmes diferentes"...  Sugiro que espere por próximas projecções no local de sempre.)

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Leviathan (2012) de Lucien Castaing-Taylor e Véréna Paravel


"Leviathan" não é um documentário. Também não é um ensaio audio/visual ou um filme avant-garde. Não, o próprio realizador, Lucien Castaing-Taylor, confirmou (no debate que se seguiu à sessão) esta impressão que me ficou depois de cerca de 80 minutos onde somos pescadores, peixes, gaivotas... Onde somos encostados à pele humana tão de perto que "o humano" se torna indistinguível do "animal", onde nos aproximamos tanto de tantos corpos - e olhos! - de peixes moribundos que acabamos por nos questionar sobre o que estes sentem - e vêem! "Leviathan" é um filme de terror e não na feição "arty", conceptual, "european". Não, é um filme de terror de "mão pesada", o que quer dizer que poderá não ser exactamente o "'Texas Chainsaw Massacre' dos peixes" que quer que ele seja, mas um "'Texas Chainsaw Massacre' dos peixes" brutal e state of the art, mais próximo até do remake produzido por Michael Bay que do original de Hooper.

Eis, então, uma experiência mais que um filme, um roller coaster quase hollywoodiano apropriadamente intitulado "Leviatã", mas onde a brutalidade não está apenas num monstro só (de facto, não há monstro nenhum...). A brutalidade está, na realidade, em toda a parte: não só na maneira como os peixes são decepados no barco pelos humanos, mas na própria forma como a Natureza - essa puta infernal - se manifesta à volta e se vai oferecendo à barbárie e ao caos. Filmado sempre à noite, consumido pelos seus movimentos atordoantes pelo mar e pelos céus, este documentário que não é documentário nenhum parece triturar em 80 minutos a versão "primeiro prato" de "Meat" de Wiseman com o horror de Ingrid Bergman quando assiste à violência dos pescadores de "Stromboli" com os rodopios da câmara demiúrgica de um "Gaspar Noé underwater" com ainda um Peter B. Hutton (e o seu "Images of Asian Music") em modo sujo, animal e heavy metal.

As "visões" de facalhões afiados que servem para "preparar" o pescado, os sons estridentes vindos do porão (como se fossem gritos lancinantes), as redes metalizadas que parecem fazer parte de um filme "sado-maso" ou de um snuff movie, os movimentos bruscos e automáticos de "homens sem rosto" que chutam restos de peixe para o mar... tudo parece saído de um horror show da pesada, em vez de um documentário sobre pesca. Já em "Sweetgrass", Castaing-Taylor e Véréna Paravel tinham filmado a travessia de dois pastores e do seu "mar de ovelhas" por montanhas repletas de lobos e ursos famintos. Tínhamos aqui em preparação o verdadeiro filme de terror que se concretiza em "Leviathan", projecção que não quererá perder durante este IndieLisboa. Até porque, fora de sala, a experiência deste filme arrisca-se a ficar reduzida a uma curiosidade com pouco interesse.

("Leviathan" passou hoje, dia 24, dentro da competição internacional. Volta a ser mostrado no dia 26, às 21h45, no Cinema City Classic Alvalade. A não perder, sobretudo se for vegetariano/vegetariana e não enjoar no mar.)

terça-feira, 23 de abril de 2013

Shirley - Visions of Reality (2013) de Gustav Deutsch


Um arqueólogo das imagens em movimento, especialista em dar "nova vida" a imagens de filmes antigos, Gustav Deutsch inverte a fórmula aqui: cria ficção a partir de 13 quadros de Edward Hopper. Não se limita a "animar" esses quadros, porquanto encontra na personagem feminina, a actriz de teatro Shirley, um elo comum a essas imagens do famoso pintor norte-americano, datadas dos anos 30 aos anos 60. As figuras mexem-se, contam o que lhes vai no espírito (por vezes em reflexões interiores, marcadas pelo tempo, que ouvimos em over) e, num momento significativo, lêem para si e para nós. É neste momento que surge a explicação para o subtítulo deste filme: Shirley lê a Alegoria da Caverna, "pondo em xeque" essa categoria frágil que é o real e acentuando o poder da representação (as sombras que se projectam nas paredes da caverna platónica). De facto, o real de Shirley é uma sucessão de "quadros vivos" assinados por Hopper, ela não consegue ver para lá deles, como em Platão os acorrentados acreditarão sempre mais nas sombras projectadas que nos objectos (do exterior) que as projectam - e, por isso, essas personagens, como Shirley, nunca conseguirão "ver o sol".

Deutsch explora bem, por um lado, a intrusão do tempo (II Guerra Mundial, perseguição anti-comunista, etc.) nos seus quadros animados e, por outro lado, a vida "pintada", irrealizada, ou representada de Shirley em cada um dos seus quadros. Sabe, enfim, tornar a pintura num habitat natural para uma personagem real, quer dizer, tão real e concreta como as sombras de Platão. Ainda assim, também não posso dizer que Deutsch consiga muito mais do que tornar eficaz este dispositivo, isto é, cumpre academicamente esta proposta, mas não vai mais longe do que poderia ir, nomeadamente quando inunda de "jogos de sentido" as suas reconstituições cinematográficas do universo de Hopper. Como seria um filme desta natureza que apenas se limitasse a reproduzir os quadros, sem se preocupar tanto em quebrar com a sua natural imobilidade? Seria, talvez, mais concretamente, uma proposta radical em torno de um remake cinematográfico de um universo pictórico, algo que desafiaria mais - e talvez melhor - os limites que separam a arte das imagens em movimento da arte das imagens imóveis. Às vezes, less is more, sobretudo quando este more pode significar tanto.

("Shirley - Visions of Reality" passou hoje, dia 23, na secção Observatório. Volta a passar dia 28, às 21h30, no Cinema City Classic Alvalade. Objecto curioso que, se for fã da obra de Edward Hopper, não quererá de modo algum perder.)

Gimme the Loot (2012) de Adam Leon


"Gimme the Loot" é, como bem se anuncia, um regresso à casa-mãe de algum do melhor cinema independente norte-americano. Morris Engel e Ruth Orkin, Charles Burnett e Spike Lee à cabeça, pelo seu "sentido de rua", o fluxo ininterrupto da acção e o seu lado coral tão directo quanto caloroso (e o calor também é literal aqui, como por exemplo o é em "Do the Right Thing"). O facto de o rapaz andar confortavelmente descalço pela cidade durante boa parte do filme (por razões que não vou desvendar) não é só uma cena caricata desta comédia descontraída, upbeat, desenrolada nas ruas de Nova Iorque. Trata-se, com efeito, de um símbolo do que este filme de Adam Leon propõe e consegue alcançar: pôr em retrato uma certa vivência de rua que subsiste numa grande cidade, em contra-corrente com o estilo de vida sedentário do homem urbano. Esta "maneira de viver a rua" tem como pretexto uma disputa de poder em torno da arte do graffiti (também ela, pelo menos nestes moldes, já com o seu quê de anacrónica) .

À imagem do que vão fazendo brilhantemente os irmãos Safdie (excepção feita à sua mais recente curta, "The Black Balloon", homenagem inconsequente ao mais célebre filme de Albert Lamorisse que também marca presença neste IndieLisboa), Adam Leon cola-se às suas personagens - por vezes, alternadamente - para "documentar" 48 horas da sua vida, sendo que a premissa aventureira - graffitar a "maçã dos Metz" - vai sendo relegada para segundo plano e o casal de protagonistas passando para primeiro plano, na sua relação "desencontrada" - como disse, em certos momentos, é um desencontro espacial, muito efectivo. Tem qualquer coisa dos hang out movies de Linklater (à cabeça, o inevitável "Slacker"), tal como parece emular a tirada rápida na ponta da língua e o encantamento geral de um Woody Allen. "Gimme the Loot" mistura as suas várias influências, mas não se prende a elas, pelo que não espere o leitor um filme-citação ou nem mesmo uma homenagem despersonalizada de um jovem cineasta aos seus "velhos" mestres. Temos aqui um espírito novo com um cinema leve, que flui ao sabor dos acontecimentos, o mesmo é dizer: que flui, ligeiro, seguindo o passo, com ou sem ténis, dos seus simpáticos "vagabonds" enamorados. Aqui estão, em resumo, uma surpresa muito agradável e um cineasta a seguir.

("Gimme the Loot" passou hoje, dia 22, na secção Cinema Emergente. Este filme volta a passar no dia 26 de Abril, às 23:55, no Cinema City Classic Alvalade. Vou roubar, off the record, um adjectivo ao João Lameira, do À pala de Walsh, para dizer que este é um filme "fofinho" a não perder.)

Museum Hours (2012) de Jem Cohen


Falar de um vigilante no Museu de História de Arte em Viena é falar de alguém que "vê à distância" tanto quanto "fiscaliza distâncias". Estar num museu é, enfim, uma oportunidade para criarmos distâncias - as mais justas possíveis - com aquilo que queremos admirar. Podemos ver, mas não podemos tocar. Johann garante que a visão se torne táctil antes que as mãos cheguem ao quadro, à máscara ou à estatueta. A sua profissão é observar, a tempo inteiro, "quem observa" e, nos intervalos, os objectos dessa contemplação. Johann conhece cada um dos quadros expostos no museu, perde-se por vezes nos mil e um pormenores de um Bruegel ou na escuridão "iluminante" de um Rembrandt. Vê pessoas, vê arte e, como tudo isto lhe dá um prazer evidente, faz-nos interrogar - e o filme puxa-nos para aí... - sobre a forma como, noutros tempos e noutros contextos, se viu o mesmo quadro, a mesma máscara, a mesma estatueta. O filme, por sua vez, responde com a mesma delicadeza e sensibilidade à sua visão e às suas palavras sempre ponderadas e in-formadas, isto é, que "abundam em formas". Trata-se de uma obra feita na medida justa da sua personagem, isto é - de novo, a problemática de museu -, que nos confere a distância certa para podermos contemplar a sua existência.

Esta é uma parte do filme, mas "Museum Hours" consegue ir mais longe, quando insere no "habitat" do protagonista um elemento estranho, uma visitante que vem de Montreal para ver uma amiga em estado de coma. Jem Cohen "usa" uma personagem para "provocar" uma história na vida de Johann para lá da sua narrativa pessoal. Anne será o elemento que, em parte, vem ficcionalizar a história de Johann, o que não quer dizer que esta personagem foi "criada" para "irrealizar" a existência riquíssima deste homem, muito pelo contrário: Cohen convoca Anne para, muito literalmente, levar Johann para fora (outdoor). A certa altura, o próprio confessa que foi graças a ela que redescobriu certos recantos da cidade onde vive desde sempre, que conhecerá tão bem como cada um dos quadros do Museu onde trabalha - e, por isso, também vive - há muito tempo. Johann sai - e nós com ele - para mostrar o lado não turístico da cidade, esforçando-se minimamente, talvez em vão, por evitar a "musealização" (no sentido de Malraux e Baudrillard) da sua Viena, mas é interessante como Anne também leva o "exterior" para o Museu, abrindo caminho, nem que seja hipoteticamente, à sua (também aparentemente desejada por Johann) desmuseificação plena.

Cohen alterna as descrições academicamente blindadas dos guias e áudio-guias com as perambulações puras de Anne em frente aos quadros, exteriorizadas por esta na companhia de um sempre-curioso Johann. É muito inteligente a forma como Cohen vai jogando com este interior/exterior, museu/rua, academismo/espontaneidade, ontem/hoje, arte/vida, sempre sem trair minimamente a real existência do seu protagonista. O último fenomenal instante de "Museum Hours" resume todo o gesto: a imagem banal, filmada em vídeo, de uma velhota a subir uma rua, uma rua "anónima" de Viena..., é comentada em over por uma voz despersonalizada - não sei se do próprio Johann... precisava de rever e que bom que deve ser rever este filme! - que a descreve com o vernáculo técnico típico dos áudio-guias. Trata-se da última inversão que Cohen põe em cena: se antes tínhamos um objecto "academizado" pelo discurso institucional "de museu" a ser comentado "sem preparação" por Anne, agora temos um fragmento banal do dia-a-dia contemporâneo filmado "sem arte" a ser descodificado pelo mesmo linguajar impositivo e ditatorial "de museu". O que se passa é que neste momento o discurso sai do seu próprio espartilho e ganha um novo sentido - sentido de liberdade, de intemporalidade - parido pelo contacto com aquela imagem não elaborada, não preparada, não musealizada, mas, lá está, mostrada na sua distância justa e certa ao espectador. Muitas linhas mais poderia escrever sobre este filme fascinante e tocante, resta-me dizer ao leitor que foi o melhor filme que vi no IndieLisboa 2013 até agora. Mais: é um dos melhores filmes que vi em sala este ano.

("Museum Hours" passou hoje, dia 22, secção Observatório. Volta a ser mostrado no dia 24, às 17h00, no Cinema City Classic Alvalade, e também no dia 27, às 19h15, no mesmo local. Não me faça a desfeita de perder este filme. E, já agora, que as distribuidoras nacionais não se demitam da responsabilidade de o "dar a ver".)

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Sinapupunan (2012) de Brillante Mendoza


Brillante Mendoza tinha feito da maternidade e das "barrigas de aluguer" a matéria para o seu melhor filme, o pouco visto - mas ainda assim dado a ver ao público português graças à Zero em Comportamento e à retrospectiva Brillante Mendoza que organizou há uns anos - "Foster Child". Esperava deste "Thy Womb" uma variante desse filme, eventualmente pondo o acento tónico no "debate religioso e moral" e menos na questão social e económica. Em "Foster Child", tínhamos uma transacção de um filho entre uma mãe pobre e uma família americana abastada, em "Thy Womb", temos uma mãe pobre que não pode ter filhos e que, por amor ao marido e por desejo (e missão) de prosseguir com a sua linhagem familiar, inicia uma busca (verdadeiro casting) pela mulher que esteja disposta a dar um filho. A sua acção não é provocada por uma necessidade económica, mas por um desejo profundo de ter filhos e de "dar seguimento" ao legado familiar.

A relação entre estes dois títulos fica-se, contudo, no papel, porque formalmente Mendoza está aqui quase irreconhecível. Não que tenha mudado o modo de pegar na câmara, nomeadamente a sua vibrante aproximação aos corpos. O cenário natural sempre-sincrético das Filipinas também não é minimamente alheio a este "Thy Womb" - sentimos que viajamos aqui pela mesma "waterland" de "Lola", por exemplo. Apesar de tudo isto, o ritmo da acção é demasiado lento e mastigado, a narração emperra constantemente em situações derivativas, desliga-se demasiadas vezes das suas personagens, ao ponto de perdermos - em certos momentos - o contacto com as suas existências e o tal "debate interno" à volta da sua senda. A linearidade narrativa, que propiciava a imersão do espectador nas histórias e viagens dos seus ou que são os seus filmes, esboroa-se ao ponto de a certa altura parecer que é o próprio Mendoza a perder o interesse pelo seu filme. Tudo isto  leva a uma declarada falta de auto-esclarecimento a delinear a rota dramática que facilmente detectamos nos seus melhores filmes, como o referido "Foster Child" e "Kinatay". Aos meus olhos, estamos, enfim, na presença de um filme falhado de um realizador que talvez tenha ascendido demasiado alto no panorama do cinema internacional.

("Thy Womb" foi mostrado hoje, dia 21, na secção Observatório. Volta a passar dia 28 de Abril, próximo domingo, às 17h00, no Cinema City Classic Alvalade. Não recomendo, sobretudo se ainda não conhece o lado mais inspirado do realizador filipino.)

domingo, 21 de abril de 2013

Doméstica (2013) de Gabriel Mascaro


Vamos falar de domésticas? Então falemos a sério de domésticas. Há um filme horrendo de Sally Potter, "Yes", que explora um pouco esse lado escondido - que provavelmente o leitor "evitará saber" - dos pensamentos de uma empregada doméstica. É que é ela que lava a sua roupa, é ela que despeja - e espreita sobre - o seu lixo, é ela que prepara as suas refeições, é ela que ouve as suas conversas - as mais íntimas. A empregada ou é uma intrusa ou é mais um elemento da família. A posição afectiva e social de uma mulher destas é matéria de sobra para um filme. Contudo, o modelo conceptual de "Doméstica" deita parte deste aliciante desafio para o lixo, já que comete o erro crasso de querer "retratar" estas mulheres pondo a câmara nas mãos de quem estas dependem. Mesmo que Gabriel Mascaro tenha delegado as suas funções em rapazes e raparigas e não nos patrões e patroas que são os seus pais, a situação que monta não deixa de conduzir este projecto a um beco sem saída.

"Doméstica" compila sete retratos de domésticas no Brasil - na apresentação, a produtora do filme disse que há cerca de 7 milhões em todo o país! - mas passa a "batata quente" da realização para os patrõezinhos. Em mais de metade destes pequenos filmes, alguns deles sem qualquer ideia de "direcção", quase arbitrariamente realizados pelos seus impreparados realizadores, as empregadas estão presas ao papel social, de subalternidade, que desempenham naquela casa, quando a ideia é - à partida - que estas saiam, por uns instantes que sejam, dessa pele e falem franca e abertamente sobre os condicionalismos da sua profissão. Os seus 15 minutos de fama reduzem-se, por vezes, a um pequeno "bate papo" mais ou menos artificial ou a uma curta "história de vida" que lhes ocorra, sobre as suas origens e a experiência de trabalhar naquela casa - repare-se como se "fixa" a sensação de que todas elas são felizes ali, nalguns casos mais felizes a trabalhar ali do que a viverem, quando as têm, nas suas próprias casas!

Num dos episódios, realizado por uma rapariga que não deverá ter mais de doze anos - mas realizado com sentido e faro de realizadora -, somos apresentados a uma "empregada de uma empregada", Bia, jovem mulher que trabalha numa casa pobre, com paredes de tijolos por acabar, e que divide o tempo entre as lides domésticas e as brincadeiras com o irmão deficiente da nossa improvisada mettrice en scène. Este será o momento mais alto desta espécie de versão "do it yourself" de "Santiago", filme de João Moreira Salles, que comete erros de palmatória na sua conceptualização, ficando, por isso, muito aquém do material riquíssimo que tem em mãos. Uma pena.

("Doméstica" passou hoje, dia 20, no Cinema City Classic Alvalade, no âmbito da secção Pulsar do Mundo. Volta a passar dia 22, próxima segunda-feira, no mesmo local, às 21h30. Aproveite esse horário para ver outro filme IndieLisboa.)

Paradies: Glaube (2012) de Ulrich Seidl


Segunda parte da trilogia "Paraíso" que Ulrich Seidl realizou quase de uma assentada apenas, em pouco mais de um ano. A protagonista, Anna Maria, é irmã de Teresa, a "turista acidental" do tomo anterior, mas a ligação pouco importa para o desenvolvimento desta história de fé, sacrifício e revolta. Como em "Paraíso: Amor", encontramos uma narrativa parabolizada e hiperbolizada subordinada a um tema - "fé", neste caso - que vai sendo desfiado por dentro à medida que a protagonista se embrenha nas suas próprias contradições. A câmara de Seidl comenta desde o primeiro plano, num gozo sádico sempre muito "controlado", os rituais levados a cabo por esta mulher que dedica parte importante dos seus dias a "evangelizar", porta a porta, os seus compatriotas austríacos. Diz que a sua missão é tornar a Áustria numa nação católica.

Seidl procura sempre uma situação bizarra e grotesca como pre-texto de uma qualquer solução visual (pretensamente) espirituosa e provocadora, reduzindo as suas personagens a uma degradante existência anedótica. Seidl esforça-se por parecer escandaloso e ultrajante, a sua heresia - afirmação de uma superioridade moral do realizador no seu mundo plastificado - acaba contudo por ser tão artificial e unidireccional quanto as personagens que tem à frente. (Dava para citar aqui o célebre texto de Truffaut, "Uma certa tendência do cinema francês", nomeadamente a parte que denuncia a mui estratégica "pose herética" dos papás conformados da Tradição da Qualidade.)

Face a "Amor", volto a sentir a mesma repetição fácil de ideias e formas, o mesmo gosto por "teatros infernais" feitos de personagens unidimensionais, que agem no sentido de um paroxismo estético e ético. Seidl põe a realidade em reverso, pega no "amor" e transforma-o numa "violação" racista dos corpos, pega na "fé" para nos falar em fanatismo, hipocrisia e desolação - tudo converge numa narrativa apocalíptica sobre a humanidade, muito "na moda", como sabemos. O dispositivo é sofisticado (uma espécie de Roy Andersson sem ironia, só com sarcasmo, sem gag, mas com excesso de caricatura), mas apenas serve para mascarar uma revolta adolescente com a vida... Da mesma forma, não há espaço para o mistério nesta mise en scène automática, morta como um museu de cera, que funciona como uma máquina produtora de situações anedóticas e personagens decorativas. Não havendo mistério, resta uma repetição circular, algo enjoativa, de desconstruções sobre desconstruções da mesma ideia, uma longa martirização de um conceito inicial - "amor", "fé"... - que se compraz a si mesma com uma certa boniteza trendy e o "choque chic". Um osso luzidio para crítico morder.

("Paradise: Faith" passou hoje, dia 20, na Culturgest, na secção Observatório. Volta a passar dia 26, próxima sexta-feira, no mesmo local, às 21h30. Não vale a pena "bater mais no ceguinho": Seidl não é, definitivamente, a minha praia.)

Francine (2012) de Brian M. Cassidy e Melanie Shatzky


"Francine" é um pequeno filme de pequenos momentos, pequenos silêncios, pequenas situações, que não se quer agigantar, nunca se agiganta, de tal modo que se arrisca a cair num vazio. Parece que nos passa ao lado e nem uma corrente de ar chega a provocar, mas não devo ser tão duro com um filme que não quer ir mais além do rosto e corpo da sua actriz, a fabulosa Melissa Leo. São 74 minutos de uma ficção anódina, mas também são 74 minutos que documentam a acção quase muda de uma grande actriz, aqui na pele de uma mulher que saiu da cadeia e tenta ajustar-se ao mundo "lá fora". Encontros e desencontros amorosos, sucessão de empregos e uma paixão alienante por animais, Francine-personagem ou "Francine"-filme só seria isto e pouco mais se não fosse Leo.

Ainda assim, consigo resgatar um instante muito bem conseguido, logo no começo do filme: Francine reaprende a caminhar sozinha pela pequena localidade onde decidiu relançar a sua vida, ouve-se (em off) uma música metal, da pesada. Perguntamo-nos se este é um "truque de montagem" para expressar a tempestade de coisas que se passam na cabeça daquela mulher. A resposta suspende-se, enquanto a câmara de Cassidy e Shatzky, o casal de realizadores, permanece colada à divagação de Francine... A dúvida desfaz-se quando entra no quadro um concerto ao ar livre, com uma dúzia de pessoas a assistir, cada uma sentido à sua maneira aquela sonoridade primitiva. Francine procura "integrar-se" nesta assistência heterogénea e aqui sentimos o mal-estar físico (= desarticulação do corpo e da mente), a "falta de ar" desta pessoa que já não sabe ser livre e que receia não ir a tempo de se "reinventar". É um momento espantoso - o mais delicado que vi até agora, no IndieLisboa - que nos faz lembrar que até nos filmes fracos - no caso, fraco no sentido de anémico ou esquelético - podemos ser surpreendidos por lampejos da grande arte do cinema.

("Francine" passou hoje, dia 20 de Abril, no S. Jorge, dentro da competição internacional. Repete já amanhã, dia 21, na Culturgest, às 19h15. Tem Melissa Leo, mas não é "Frozen River", nem nada que se pareça. Contudo, se quiser comprar um bilhete para assistir a uma cena brilhante com 5 ou 6 minutos, então tem a minha benção cinéfila.)

sábado, 20 de abril de 2013

Rocker (2013) de Marian Crisan


"Rocker" é um "filme de personagem". Digo-o no singular de propósito, tal como o próprio título singulariza esta história vivida "a dois", sobre um pai que se projecta no filho e um filho que se projecta no pai. Rockers? Não, "Rocker", no singular, objecto orgulhosamente "filho do pai". Afinal, é ele que alimenta o sonho e subsidia o estilo de vida do seu rebento, um newborn rocker feito à sua imagem, logo, também com o seu quê de old school. Como tal, a sua inspiração tem de vir do álcool, do fumo e... da heroína. Não sabemos ao certo como é que este pai e este filho foram "arranjar" esta situação, na realidade, quase caímos de pára-quedas para constatar que algo aparentemente muito destrutivo junta aqueles dois na senda do mesmo sonho. Não há tons trágicos, nem nenhum precipício dardenniano que vá fazendo rolar as personagens para o abismo. Não, neste "Rocker", estamos condenados a acompanhar os pequenos rituais diários deste pai como se fossem um "dado" mais ou menos imutável - o filme passa e, apesar da dureza de certas cenas, quase não damos conta dele. O eterno rocker limita-se a pedir a Deus que o vício pare, mas poucas serão as medidas que toma para que algo mude. O pai tal como o filho está focado no seu objectivo e aceitará tudo ou quase tudo para o levar avante. Primeiro, um concerto em Bucareste e, depois, logo se vê.

Se não sabemos bem por que esta personagem chegou ao ponto em que chegou, a câmara de Marian Crisan dá-nos a ver o "como": como sobrevive este pai à vida que leva? É comovente a forma como acabamos por descobrir um certo "equilíbrio" nas acções deste homem. Descobrimos, por exemplo, como a sua decisão de se tornar no principal dealer do filho é uma maneira de o proteger e, logo, uma demonstração de amor. Aliás, este é um pai rocker afectuoso, Big Daddy ou "altruísta de merda", como lhe chama a certa altura o filho, homem solitário que vai doseando - e "dose" é a palavra certa - as frustrações da vida com pequenos momentos de ternura vividos na companhia da sua namorada, mãe solteira com quem alimenta uma vida "paralela" que dificilmente terá grande futuro, mas que o mantém longe da degradação das drogas ou do êxtase desgovernado (mas ainda muito excitante) do rock. Também encontra refúgio na música, no futuro que vê no seu filho e na banda que lidera, "Os Iguanas" - sem um pingo de sentimentalismo, aliás, como digo, nunca o filme nos leva ao passado, este pai também se revê no filho. Companheiro de viagens, seu fã número um, de uma maneira estranha - quase perversa - temos aqui, na figura do pai - raras vezes é assim -, um exemplo de amor incondicional. Aliás, de um certo modo, eis o caso singular de um pai exemplarmente não exemplar. É a explorar esta contradição que este filme de curta ambição constrói, à boa maneira do cinema romeno, uma personagem e um minimamente envolvente microcosmo sentimental.

("Rocker", que passou hoje dentro da secção Cinema Emergente, dia 19, no Cinema City Classic Alvalade, volta a ocupar o mesmo cinema, no próximo dia 21, um domingo, às 19h, e dia 27, um sábado, às 14h30. Não é um Cristian Mungiu, um Radu Jude ou um Cristi "Sr. Lazarescu" Puiu, mas vale o preço do bilhete.)

Death Row (2012) de Werner Herzog


Pena de morte. Eis um assunto que por muitas vezes que seja levantado por cineastas, políticos, filósofos ou apenas por cidadãos anónimos não perde, por um momento, a sua inquestionável pertinência e sentido de urgência. Herzog não dá tempo para o espectador se perder em especulações vãs e faz a devida declaração de princípios logo na abertura de cada um dos episódios desta mini-série intitulada "Death Row": "As a German, coming from a different historical background and being a guest in the United States, I respectfully disagree with the practice of capital punishment". A partir daqui, entramos no "abismo", mais concretamente, na cabeça de cinco condenados que aguardam, alguns já sem acalentar esperanças noutro desfecho, pela marcação daquele que será o seu último dia de vida na Terra. Herzog continua a marcar terreno depois do prólogo quando diz, cara-a-cara com o entrevistado, que não está ali porque "gosta" dele, nem está ali para o "inocentar". São duas posições desconcertantes para quem está habituado ao sensacionalismo simplista dos media norte-americanos - e não só, e não só... - onde o registo da reportagem ou da "história de vida" encobre a vontade exploratório de julgar pessoas na praça pública, etiquetar caracteres e definir destinos ali mesmo, ao vivo e a cores. Herzog não vai por este caminho, ou melhor, diz que não irá por aí, deixando o entrevistado nitidamente intrigado pela "razão de ser" da sua presença.

O que busca, então, o realizador alemão? Há um ano, logo no primeiro dia de IndieLisboa, vi "Into the Abyss", longa-metragem que serve de antecâmara para esta série dividida em quatro episódios, correspondentes a cinco histórias de vida, que reproduzem crimes hedíondos, que se alimentam de uma especulação mortificante sobre o futuro-sem-futuro daqueles "dead men walking" e/ou que lançam a dúvida mais genérica, quase existencial, sobre os limites da natureza humana. O fenómeno de identificação-projecção é tenebroso quando temos à frente, no ecrã, um rosto que fala, se expressa, sonha e sente como nós, espectadores livres, "personagens" que apenas contemplam, "de fora" e à distância, o ecrã "cativante". A divisória envidraçada, transparente, que separa Herzog dos condenados é a mesma que nos separa de cada uma daquelas histórias - histórias? Não, como o próprio acentua no último episódio, de cada um daqueles SERES HUMANOS. A proximidade entre "eles" e "nós", quase sem sentirmos a confortável "distância de segurança" que alguma ficção norte-americana por norma nos  assegura, é um dos principais testes que esta série coloca aos seus espectadores - e estou certo que, para muita gente, a experiência raiará o insuportável.

Posto isto, vistos que estão estes 200 minutos de sofrimento humano - para o lado das vítimas, para o lado dos criminosos, para o lado do sistema judicial e da sociedade norte-americanas -, tenho a dizer que, enquanto "objecto cinematográfico", "Death Row" não acrescenta nada que não esteja já expresso e bem condensado na longa-metragem "Into the Abyss". Vou mais longe: enquanto "objecto cinematográfico", esta mini-série lançada no canal britânico Channel 4 arrisca expor-se em demasia a uma certa incapacidade de Herzog em localizar as razões profundas deste projecto.  Se no primeiro episódio, o próprio torna claro o que já disse atrás - que não está ali para "inocentar" nem para "gostar de" ou tornar aquela pessoa "apreciável" -, nos últimos, sentimos que, pelo caminho, "Death Row" vai perdendo o seu foco principal, acabando por se tornar, na história de Linda por exemplo, num objecto quase banalmente televisivo ou tipicamente jornalístico, de reconstituição e confrontação, de ponto e contra-ponto, de acusação e defesa, pondo em cena uma espécie de "segundo julgamento", algo que qualquer um daqueles condenados decerto agradecerá.

Nos últimos episódios, sente-se que já vai longe ou que se perdeu algures pelo caminho o intento inicial de Herzog, que passava por questionar pessoas à beira da morte sobre as suas concepções de liberdade, justiça e comunidade, sobre as suas noções de tempo, os sonhos e pesadelos e as suas fantasias mais terrenas. Esta gradual desfocagem é relativamente evidente para quem assistir a "Death Row" como se fosse um objecto de cinema, isto é, para quem - como eu - o viu em continuidade, apenas com uma relativamente curta interrupção entre as Partes I-II e as Partes III-IV. Ora, "Death Row" não é um filme, mas sim um produto televisivo. Programá-lo como algo diferente poderá involuntariamente "jogar contra si", pondo a nu um conjunto de fragilidades que não serão tão facilmente detectáveis no suporte mediúnico para o qual, originalmente, este se destina. Posto isto, claro que está aqui uma série relevante, com uma distinta "marca de realizador" - o humor negro de Herzog desconcerta-nos ao ponto de não sabermos como reagir, se com riso, com choque, angústia ou tudo ao mesmo tempo - e uma capacidade rara - raríssima na televisão, isso garanto - de nos interpelar, bem fundo, sobre tudo aquilo que damos como garantido, começando, como é claro, pela nossa própria vida.

(Os quatro episódios de "Death Row" foram exibidos, dentro da secção Observatório, ao longo do dia de hoje, 19 de Abril, no Cinema City Classic Alvalade. As Partes I e II voltam a passar no mesmo cinema, dia 21, domingo, às 21h45. As Partes III e IV são mostradas seis dias depois, dia 27, sábado, também no Cinema de Alvalade. Tenho de dizer que me parece mais feliz programar estes dois blocos com alguma distância temporal entre si, na medida em que aproxima o objecto do modelo de programação para o qual este fora originalmente pensado e concebido. Reexibido nestes moldes, não posso deixar de recomendar, ao espectador com a predisposição certa e que ainda não viu "Into the Abyss", esta exigente experiência humana.)

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Paradies: Liebe (2012) de Ulrich Seidl


Podemos plantar um girassol numa lixeira, fazer um enquadramento academicamente rigoroso com o centro no objecto que irradia a beleza pura e relegar a lixeira para o background - o amarelo luminoso da flor irá "pictorializar" o cenário. Não se pode dizer que "Paradise: Love" "funcione" tal e qual, mas é muitas vezes evidente - e apanhado em falso - no seu esquematismo formal, na sua intenção programática de criar algo a partir de sucessivos efeitos-choque. Eu posso filmar uma mulher na casa dos cinquenta, ignorada pela filha teenager que cuida na ausência de uma figura paterna, que programa umas escapadelas no Verão para um resort de luxo no Quénia, onde encontra paz de espírito e algum reconforto no seio das suas amigas. Elas, mulher e amigas, podem gostar de se soltar mais um bocadinho na companhia de um "acompanhante" negro e eu posso filmar isso como consequência mais ou menos natural da vida que levam lá, na distante e triste Europa, ou como corolário, enfim, do seu "mau envelhecimento". Todavia, o que Seidl busca não é - não pode ser! - uma reflexão sobre a solidão ou o envelhecimento, nem tão-pouco aprofunda esse mal-être europeu ou quer entender o "Amor" que tem no (sub)título. Muito pelo contrário, sempre com a câmara apontada para o tal "girassol (plantado por si) na lixeira", Seidl delicia-se com a permanente perversão de todas estas - ou de todas "as" - ideias; logo, o que verdadeiramente ele acaba por filmar é o seu próprio gesto maquinador ou interesseiro.

A protagonista deste filme, Teresa, vai para o Quénia para encontrar - imagine-se! - não "carne fácil", um éden onde possa "fazer esquecer" o seu corpo estragado pelo tempo, mas sim amor ou, mais concretamente, um "homem que possa olhar nos olhos". O primeiro choque deste primeiro tomo dedicado a "paraísos perdidos", empreendimento de peso (se calhar, de betão...) que Seidl lançou no espaço de pouco mais de um ano, é facilmente localizável aqui ou mesmo um pouco antes, quando fica evidente que Teresa é muito diferente da sua amiga "debochada". Seidl apresenta-nos, então, uma senhora cheia de (falso) pudor, auto-consciente da idade e do corpo, que viaja até ao Quénia para encontrar um africano jovem e atlético que olhe para ela para lá dos efeitos mais visíveis da idade - estranho que não se preocupe ela em olhar para lá da idade daquele, mas... enfim, estamos em África, tudo vale! Não sabemos quem quer mais iludir a sua situação, se a amiga descarada que paga para ter sexo, se a nossa protagonista que não se parece dar bem com as "maneiras" dessa economia. Este é o primeiro choque do filme e é habilmente explorado, pelo menos, até ao ponto - ainda assim, algo óbvio - em que Teresa bate com o nariz na porta, após ser morosamente arrastada por uma relação que só podia ser autêntica numa cabeça fantasiosa e auto-iludida.

O choque moral também é um choque entre corpos. De um lado, os corpos pálidos e descaídos de cinquentonas com cio, do outro, os de jovens na "flor da idade" que se prostituem nas margens daquele hotel luxuoso totalmente separado do exterior - chegam mesmo a dizer qualquer coisa como "bem-vindo a África" quando Teresa passa a corda que separa o hotel da praia. A partir do momento em que os corpos se misturam uns com os outros, a câmara de Seidl não cessa de procurar - o verbo correcto é, na realidade, "provocar" - mais pontos de choque. Composições geométricas, imediatamente chamativas, fazem-nos sempre alternar (às vezes dentro do mesmo quadro) entre o luxo e o lixo, entre o feio sofisticado e o belo mais deslavado, tal como, de um ponto de vista dramático, a posição das personagens está sempre algures entre a agressão passiva e a vitimização violenta. Há uma espécie de chantagem calculada - demasiado visível - no esquema narrativo e moral: Teresa não quer descer ao nível da amiga até ao ponto em que acaba por descer mais baixo; Teresa vai até certo ponto no caso com Madunga, para depois cair com estrondo em si; Teresa é esquecida pela filha no seu dia de anos, sente-se destroçada, até ao momento em que - surpresa! - uma festa debochada lhe bate à porta. Lamentavelmente, caro Seidl, as costuras - como as banhas - estão todas à mostra aqui.

Perto do fim, já desconfiamos que em momento algum Teresa é/foi uma pessoa (se calhar é uma caricatura) ou uma pessoa com "sentido de dignidade" (se calhar é uma marioneta num teatro alienante), mas, apesar disso, a câmara de Seidl acompanha-a com compaixão - o comiserante plano final é eloquente, deste ponto de vista. Ao mesmo tempo, Seidl reduz os corpos dos homens africanos ora a objectos de uma performance degradante, ora a agentes de um esquema rasteiro onde se trocam "sentimentos" por dinheiro. No próprio título do filme, o realizador austríaco, quiçá simpatizante da "religião Haneke", procura vender uma coisa (amor... romântico) para nos dar outra em troca (sexo... cru, morto, sem alma), sendo que toda a economia visual e dramática deste "Paradise: Love" se baseia numa concepção apocalíptica da humanidade, numa exploração sem filtros - esta será a única constante que denuncia o tal "esquematismo" calculado - do lado mais indigno, quando não repulsivo ou simplesmente baixo, das suas personagens, a começar pelos sempre-dissimulados e mal agradecidos africanos e a acabar (menos implacavelmente) nas decadentes velhas ricas da Europa ou nas velhas ricas da Europa decadente (nota política que acaba por se diluir, e por se frustrar em toda a linha, no discurso ideologicamente dúbio de todo o filme). Apesar de tudo isto, marcarei presença, como acordado, nas passagens de "Paradise: Faith" e de "Paradise: Hope". Pode ser que esteja enganado...

("Paradise: Love" passou hoje, dia 18, na secção Observatório. Volta a ser exibido no dia 25, próxima quinta-feira, na Culturgest, às 21h30. Sem prejuízo de se encontrarem outras valias no que resta da trilogia - e obra - de Ulrich Seidl, escrevo eu que pelo menos este primeiro tomo não deve estar, de modo algum, no topo das suas prioridades festivaleiras.)

quinta-feira, 18 de abril de 2013

À pala de Walsh/CINEdrio no IndieLisboa 2013


Vão ser exactamente 11 dias de cinema, o CINEdrio estará em cada um deles, complementando o que estiver "em falta" na cobertura que o João Lameira fará no vizinho À pala de Walsh. As minhas participações na cobertura para o site consistirão em pequenas cápsulas que se propõe resumir os textos que, no seguimento do que fiz há um ano, irão merecer uma extensão mais consonante com os posts deste blogue - ainda que, naturalmente, mais sintéticos do que as críticas alargadas que por aqui, de quando em vez, vou deixando.

De qualquer modo, a antevisão que fiz com o João aqui também serve ao CINEdrio, na medida em que tentarei cobrir boa parte dos títulos sugeridos. A minha intenção é, por um lado, antecipar-me num conjunto de reflexões acerca de filmes ainda fresquinhos, acabados de produzir alguns deles, e, por outro lado, guiar o leitor nas suas próprias escolhas para este festival, que começa hoje e termina no dia 28. De resto, seguirei exactamente o mesmo modelo adoptado na cobertura ao IndieLisboa 2012, com espaço final para observações quanto à organização e balanços cinéfilos.

Resta-me desejar óptimo cinema a todos e até mais logo!

terça-feira, 16 de abril de 2013

Fazer da deserção militar um exemplo e de um exemplo uma deserção moral e humana

"Paths of Glory" (1957) de Stanley Kubrick

"King & Country" (1964) de Joseph Losey

(Sobre mais comparações possíveis entre Kubrick e Losey ou, invertendo a ordem, entre Losey e Kubrick, veja "These are the Damned" para depois rever "The Clockwork Orange".)

sábado, 13 de abril de 2013

Pillow shot: uma pausa para confortar o ego


Na crónica de Eduardo Cintra Torres, publicada no passado dia 24 de Março no Correio da Manhã, registei com grande prazer a parte que dedicou ao "trabalho de bastidores" que esteve por trás do aplaudido relançamento da rubrica "5 Noites, 5 Filmes". O movimento cívico que chamou a atenção da estação para a necessidade de uma programação de cinema sólida e regular nasceu aqui, no CINEdrio, tornou-se numa petição assinada por milhares de cidadãos, que foi à Assembleia da República, que motivou um debate com o antigo director do canal. Foi produzida reflexão, mas, antes de tudo, foi restaurada uma cultura de maior exigência em relação às opções editoriais da televisão pública no que diz respeito à sua missão de divulgação e preservação da memória cinéfila.

A frase curta mas significativa de Eduardo Cintra Torres que quero aqui destacar, em jeito de síntese do meu reconhecimento em relação a todos os que fizeram parte desta causa, é portanto esta: "Por pressão da sociedade civil, a RTP2 repôs agora o programa ["5 Noites, 5 Filmes"], pondo fim ao câmara-obscurantismo de Wemans e Moura Pinheiro".

***


A T-shirt é da autoria da Sabrina Marques, a nossa colaboradora da Newsletter do CINEdrio, projecto que - como todas as comunidades de interesses e paixões - vive destas manifestações de amor. Sabem bem, como também sabem bem as palavras que o Carlos Reis, do blogue Cinema Notebook, escreveu a propósito desta nossa folha, num post com o sugestivo título "Uma newsletter que vale a pena!". Agradeço ao Carlos a atenção e reforço que a divulgação por parte dos nossos leitores é a nossa única publicidade; logo, o nosso crescimento depende da capacidade que os leitores terão ou não de, por assim dizer, "vestirem a camisola". 

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