quinta-feira, 13 de outubro de 2011
Alien 3 (1992/2003) de David Fincher
A questão da maternidade de Ripley é finalmente assumida como "main subject" no terceiro filme da saga Alien. Ripley perdeu uma filha, que a ultrapassou em longevidade no decurso de uma viagem intergaláctica pelo eixo espaço-tempo... Zuuuummmm, se em "Alien" a protagonista tinha alguma coisa por que voltar, em "Aliens" esta "mulher de armas" enfrentava a notícia impossível: a sua filha morrera, já velhinha... Perdida no espaço e no tempo, Ripley foi projectada no futuro, mas não perdeu a sexyness - e apetece dizer que as cabeças "interiores" dos bicharocos vão-se falocratizando cada vez mais à medida que Ripley está só, sem companheiro, mas sobretudo, agora, pela primeira vez, "sem cria".
Não quero virar Zizek aqui - quem sou eu para isso, que nem li o Lacan de uma ponta à outra... -, mas parece-me evidente que estes filmes, que agora revejo passados bons anos, são de uma sensualidade inusitada: Weaver não é a típica "mulher viril", ela é, ao invés, a mais feminina das "mulheres viris". Perante uma ameaça de morte, debaixo de um clima de enorme tensão psicológica ("Alien") ou de explosão nervosa e cinética ("Aliens"), como pode o milieu sexualizar-se? Pode fazê-lo graças aos temas da maternidade de Ripley e do desejo da besta (= possuir Ripley), que, como todos os desejos profundos, ou melhor, como todas as fantasias "humanas", tarda em realizar-se.
No terceiro filme, Ripley perde a rapariga que tinha cuidado como se fosse sangue do seu sangue - ela, uma sobrevivente dos "maus tratos" da besta, ela, a última esperança de Ripley de concretizar o tal "sonho adiado da maternidade", ela que a fazia sentir mulher num meio de homens de barba rija, ela, enfim, símbolo da sua luta contra a besta, ela, ainda não acabei, que motiva o épico "cat fight" entre Ripley e a Rainha dos bichos no final da obra-prima de Cameron... A morte da rapariga, que abre friamente o terceiro filme da série, é o começo do fim para Ripley. Agora está de novo completamente só - no espaço... pior, numa prisão no espaço, precisando ainda mais, entre violadores e homicidas vendidos ao Diabo, a quem votam orações como se se tratasse do Messias que os vai redimir de todos os pecados. Ripley procura então uma solução última: deixar de fugir da besta, juntar-se a ela fazendo-se parte da família. A gravidez não planeada é o culminar da luta de Ripley contra o instinto maternal, talvez, o elemento que melhor liga os três - na realidade, os quatro! - filmes da saga Alien.
Por tudo isto, fico chocado com a versão reeditada do filme de Fincher, feita de propósito para a edição em DVD de 2003 - e que, agora em Blu-ray, foi recuperada com a bendita opção de ver o original de 1992. Para tornarem congruente o início do medíocre filme de Jeunet, os produtores decidiram cortar o instante em que Ripley volta a ser mãe momentaneameante, antes de ser engolida pelo fogo, dando à luz a nova Rainha dos alienígenas - é uma menina!
Se Fincher tinha pensado fazer de "Alien 3" uma espécie de obra de capela que punha Ripley e o Alien no mesmo plano messiânico; como se ambos fossem, enfim, parte da mesma "mensagem divina" que, pela morte?, ia libertar os prisioneiros da sua vida de sacrifício, então a amputação do ending original só pode constituir um inaceitável golpe nas intenções mais arrojadas de Fincher. Ora, ao cortarem essa cena icónica, os produtores do filme esvaziaram de significado litúrgico o suicídio final, momento do "nascer" e momento do "morrer" - na realidade, momento-síntese da trilogia em que Ripley QUASE materializa o seu sonho de "renascer" dando vida a algo. Uma versão criminosa, portanto, de um filme que, pela sua fragilidade congénita - que não quero com este comentário camuflar -, merecia cuidados suplementares.
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