segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Gambit (1966) de Ronald Neame


A comparação nunca será propriamente feliz, mas de momento não se arranja melhor: se King Kong só aparece no filme de Jackson passado mais de uma hora, Shirley McLaine não profere uma única palavra durante os trinta minutos iniciais de "Gambit", heist movie assinado pelo (director de fotografia de nomes de peso do cinema britânico, como David Lean e Powell & Pressburger, tornado) realizador Ronald Neame.

Já tinha avisado que a comparação podia soar forçada, mas, perguntará quem ainda tem fé nestas linhas, onde é que esta poderá resistir à mais completa derisão? Talvez - eu disse talvez... - a grande semelhança entre Kong e McLaine nesses filmes seja o facto de ambos os protagonizarem mas só tardiamente lhes ser dado... o dito protagonismo (na sua acepção tradicional). Ou, mais ainda, porque Ronald Neame vai mais longe na ousadia que Peter Jackson: a ausência de McLaine é apenas e só "vocal", ao passo que Kong apenas habita naqueles "longos" 70 minutos nas conversas dos personagens ou na cabeça dos espectadores que viram o original e outros remakes da história do grande gorila apaixonado.

Pois é, "Gambit" tem, a abrir, uma McLaine esfíngica na aparência, sepulcral pelo que não diz - que é nada, nem um gemido... -; depois, entra em cena uma McLaine a 200 à hora, de língua sempre pronta a disparar as mais certeiras tiradas. A primeira existe na cabeça de Caine, o ladrão inglês da high society e a segunda existe... EXISTE. A primeira nasce de um what if? seco e directo - com intriga demasiado simples para ser verdade - e a segunda é um what it is que vem destruir o plano do James Bond/Thomas Crown wannabe Michael Caine, inglês arrogante que toma a sua vítima - um árabe muito rico - por imbecil.

"Gambit" é a inversão de filmes como "Ocean's Eleven" (o de Soderbergh): primeiro assistimos ao golpe perfeito na cabeça de Caine e depois à sua destrambelhada concretização - porque McLaine, que é usada como isco, fala mais do que deve ou Caine pensa de mais nos seus planos impossíveis.

Enfim, Neame fez um cocktail interessante entre o heist movie e a screwball comedy, tirando partido de uma dinâmica muito especial entre dois grandes actores, apesar de, como o Kong - lá estou eu de novo com esta estúpida comparação... -, o filme ser dela por inteiro, quando fala e mesmo quando não fala.

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