terça-feira, 24 de março de 2009

domingo, 22 de março de 2009

Regressar em 2009 (VIII)

O trailer oficial do último filme de Pedro Almodóvar consegue ser mais belo que o seu já aqui divulgado teaser. Nele pressentimos o lado negro de uma história de amor e vingança e a palpitação de um grande drama humano. Foi com a recém oscarizada Penélope Cruz de um lado e Blanca Portillo do outro que Almodóvar iniciou, no passado dia 13 de Março em Madrid, a apresentação de "Los abrazos rotos". Em conferência de imprensa, o realizador espanhol revelou que este é um filme romântico que tem subjacente a história do seu amor pela Sétima Arte. Penélope Cruz sublinhou, por sua vez, a importância de Pedro Almodóvar na sua vida profissional e pessoal. "Los abrazos rotos", o filme mais caro de sempre de Almodóvar (11 milhões de Euros), deverá estrear nas salas portugueses em Setembro.

A informação data de Janeiro, mas, pelo seu valor pedagógico intemporal, decidimos publicitá-la neste post. Falamos do pequeno diário que a cineasta argentina Celine Murga escreveu durante as filmagens do último filme de Martin Scorsese, "Shutter Island". Para além de levantar o véu sobre a forma como Scorsese concebeu algumas cenas do argumento, inclui referências deliciosas às principais influências, literárias e cinematográficas, que Marty teve (directa ou indirectamente) em mente na realização deste filme. A divulgação de tão precioso documento esteve a cargo dos Cahiers du Cinéma. Poderão lê-lo (atenção aos spoilers!) através deste link, que, para além disso, tem em anexo imagens de alguns storyboards do filme.

(continua)

domingo, 15 de março de 2009

Gran Torino (2008) de Clint Eastwood

"Gran Torino" é apontado como o último filme com Clint Eastwood. Trata-se, portanto, de um filme de despedida, o render das armas de uma figura viril, solitária, muitas vezes sem nome, com passado incógnito ou demasiado traumático para ser recordado, que se pauta por princípios rígidos, inalienáveis, que acredita na família que se escolhe e não naquela que Deus nos impinge; logo, um crente mais ou menos esperançoso no Homem ou um homem que age por amor. E daqui retiramos dois temas basilares da sua obra: a família e a religião. A primeira, como dissemos, é quase sempre abnegada pelas suas personas como um "conceito" estanque e inultrapassável - cá está o maldito "conceito do conceito" a intoxicar uma conversa sobre afectos, vide o polvoroso debate em torno dos casamentos gay.

De facto, nos seus filmes a ideia de família é, quase sempre, a origem da frustração ou mesmo do ódio das personagens. Vejam-se dois exemplos: "Absolute Power" e "Million Dollar Baby". Se no primeiro Clint é um ladrão "à beira da reforma" que procura reatar a relação com a filha, que justamente prefere pensar que este não existe nem nunca existiu, no segundo temos um treinador de pugilismo que envia cartas a uma filha que abandonou e que, à falta de resposta, acaba por perfilhar, para ocupar o vazio no coração, a rapariga que a muito custo aceitou treinar. E o que dizer da família desta última? Um bando de rednecks, dissimulados e oportunistas, que sugam até ao tutano cada centavo que a pobre rapariga ganha com o seu suor.

A cena em que a horrorosa mãe procura sacar dinheiro da sua filha, quando esta está acamada, às portas da morte, parece equivaler à cena em que o filho e a nora de Walt Kowalski, o veterano de guerra irascível e reaccionário de "Gran Torino", procuram convencê-lo a mudar-se para um lar de terceira idade, com o mal disfarçado objectivo de ficaram com a sua bela casa, com uma bela mobília retro e a pièce de résistance, um imaculado Ford Gran Torino de 1972. Kowalski nunca se deu bem com a sua família e a morte da sua mulher, fiel companheira, abre até rasgar as suas cicatrizes interiores. O ocaso de Kowalski começa com a morte e a solidão que vem com ela. São estas que o despertam, como um epifania, para a realidade: ele olha à volta e já não reconhece o seu bairro, o seu país. Kowalski é remetido, ou melhor, remete-se a uma espécie de apatrídia forçada num país que não é para velhos (sobretudo, os da sua estirpe).

Em suma, a viuvez leva-o a desenterrar o passado e a confrontar-se finalmente com o seu próprio reflexo, a saber: os fantasmas da Guerra da Coreia, de todos os homens e crianças que matou, a constatação tardia de que é um pai falhado e o desolador cenário do seu bairro, o microcosmos de uma América descaracterizada, empestada como nunca pelo vírus da multiculturalidade (os "chop-soys", "os carvões", os italianos filhos da puta e, por que não?, ele, um polaco de merda). E, por tudo isto, o seu organismo de idoso sangra por dentro, como uma bala vinda do coração - lembram-se de "Blood Work"? Uma hemorragia interna que não estanca e um reflexo, no espelho ou fora dele, que se impõe.

O anti-herói de "Gran Torino" é, entre outros, o Dirty Harry (a ideia fascista de vingança como princípio de uma certa higienização da sociedade), o "homem sem nome" (sem dúvida, só um cowboy fuma, cospe e puxa o gatilho daquela maneira), o treinador Frankie Dunn (na relação com Deus e no seu propósito sacrificial), o general Kuribayashi (mais por dentro do que por fora) e o sargento Highway (mais por fora do que por dentro) num só corpo, que está velho e exausto e que busca redenção ou paz, como Kowalski lhe chama, no amor. "Old school", portanto.

Kowalski continua a ser todos eles quando se afeiçoa a uma família hmong que vive na casa ao lado da sua. Ele adopta-a tal como Dunn perfilhou a jovem lutadora de "Million Dollar Baby". Ele desembaraça-se dos seus preconceitos racistas e xenófobos tal como aquele se desembaraçou do seu machismo e tal como um caçador branco mostrou, num dos seus filmes, ter um coração negro. Clint Eastwood filma esta mudança na sua personagem como se fosse uma transfusão de sangue novo para o seu organismo. É a partir deste momento, crucial, que a sua reabilitação começa: torna-se numa espécie de pai/avô para a rapariga e o rapaz hmongs e a este último empresta-lhe a sua experiência de vida, classicamente simbolizada pela "doação" das ferramentas da garagem e, por fim, do seu Gran Torino.

Toda a simbologia da história de Kowalski resume de forma lapidar alguns dos principais traços de Eastwood. Contudo, nem tudo é perfeito aqui. Desde logo, a mudança de Kowalski parece-nos abrupta ou pelo menos apressadamente resolvida em duas cenas algo desinspiradas: o "assalto" do gang de asiáticos à casa dos vizinhos, por causa de Thao, o rapaz, e o assédio do grupo de negros a Sue Lor, a rapariga. Estes são os trigger events que nos transportam para a segunda parte do filme, desencandeando a tal metáfora da "transfusão de sangue". As duas cenas, mais a segunda, parecem-nos artificiais e mal interpretadas.

Aqui entram dois problemas de "Gran Torino": a intermitência, algo redutora, das personagens na narrativa (veja-se a do padre) e, coisa rara em Eastwood, a por vezes aflitiva falta de qualidade de alguns actores (à cabeça, o miúdo que faz de Thao e a rapariga que incarna a adolescente hmong, Sue Lor). Por muito que admiremos a interpretação de Eastwood, a proeminência da sua persona como que seca dramaticamente as outras personagens, o que é agravado pela inconsistência congénita de alguns actores.

(alerta para spoilers, a partir daqui)

Por outro lado, e apesar de toda a história de Kowalski ser filmada com a clareza e limpidez que conhecemos em Eastwood, o trabalho de claro-escuro de Tom Stern não nos parece tão inspirado aqui como, por exemplo, em "Million Dollar Baby". Mas, acima de tudo, a imagem da queda redentora de Kowalski parece-nos pouco subtil. O paralelismo crístico devolve ao filme a questão do religioso com um sentido, a nosso ver, algo perigoso. Nesse momento Eastwood procede a uma sacralização ou uma purificação litúrgica de Kowalski, quando o seu sacrifício é feito por Thao e não por Deus. Tal como a sua confissão (forjada) ao padre é feita para cumprir a vontade da sua mulher e não a vontade de Deus.

Da mesma forma, ele não perdoa toda a humanidade pelos seus pecados como Cristo na cruz, o que é mais do que visível na cena em que ficamos a saber o que Kowalski deixou no testamento para os seus familiares de sangue versus de coração. É que, para nós, "Gran Torino" não é a história de uma conversão, mas de uma descoberta íntima, interior... Nada tem de divina ou mitológica. O que urgia aqui era a desmontagem do mito e não a sua consagração.

A confusão agudiza-se ainda mais num dos últimos planos do filme. Provavelmente, o mais violento de toda a filmografia de Eastwood: o corpo de Kowalski, isto é, o de Eastwood, deitado no caixão. O realizador filma a sua própria morte da forma mais despida possível: de caixão aberto. O divino dá finalmente lugar à matéria. Mas este plano assombroso chega tarde demais para nos demover do sentimento de desilusão em ver o segundo filme consecutivo de Eastwood sem a solidez e a inspiração dos seus melhores trabalhos. Enquanto não o revemos, ficamos a remoer a muito dolorosa sensação de uma despedida que não está à altura do melhor Clint Eastwood.

Ler mais aqui: IMDB.

A revista Red Carpet diz The End

Para quem se interrogava sobre o lançamento da edição de Março, está aqui a resposta. Após aturada reflexão, a redacção da Red Carpet decidiu pôr fim ao formato revista e passar a dedicar-se exclusivamente ao site, que sairá naturalmente revigorado com esta mudança.

Trata-se, portanto, do fim de uma colaboração que se estendeu, muito especialmente, pelos 10 artigos que escrevemos para a rubrica "Cinema Clássico". Ainda assim, e como prometido, procuraremos que o artigo "Sullivan's Travels: O Fim do Cinema" seja publicado no site nos próximos dias. (Adenda: ei-lo.)

Em nome do CINEdrio e da equipa da Red Carpet, deixamos um muito obrigado a todos os leitores que seguiram o percurso desta revista feita de carolice e amor à Sétima Arte.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Angel Face (1952) de Otto Preminger (III)

Na sequência de I e II , elaborei um ensaio com cerca de 20 páginas sobre a importância do filme "Angel Face" na obra de Otto Preminger. O trabalho foi realizado no âmbito da cadeira de Realização Cinematográfica do mestrado de Cinema e Televisão da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Torno-o, a partir deste momento, disponível em PDF neste link.

domingo, 8 de março de 2009

quarta-feira, 4 de março de 2009

Regressar em 2009 (VII)

A grande novidade do dia: acaba de ser lançado on-line o trailer do muito esperado "Public Enemies". Face a estas primeiras imagens, podemos confirmar a dinâmica à la "Heat" entre Christian Bale e Johnny Depp e, pela primeira vez, apercebemo-nos da grande proeminência na narrativa da personagem interpretada pela francesa Marion "Edith Piaf" Cotillard. É também muito interessante começarmos a antever o efeito da estética do digital num filme cuja acção se desenrola nos anos 30. Para ver o trailer, basta um clique sobre a imagem do poster acima.

Já foi divulgado o cartaz promocional de "Los abrazos rotos". Nele, a estética de Almodóvar permanece inconfundível, com as suas cores garridas, fassbinderianas, sem indícios óbvios do tal negrume que o próprio promete para este filme. Quer dizer, o rosto e o corpo de Penélope Cruz - mais uma nomeação ao Óscar no horizonte? - comunicam tudo menos quietude ou paz de espírito. Estreia no dia 18 de Março em Espanha.

(continua)

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