domingo, 28 de agosto de 2011
quinta-feira, 25 de agosto de 2011
Nova trilha (XXIX): Shearer e Bowie
Moira Shearer em "The Red Shoes" (1948) de Michael Powell & Emeric Pressburger*
*Ainda melhor e - impossível? - ainda mais belo: Put on your red shoes and dance the BLUS.
sábado, 20 de agosto de 2011
Paper Moon (1973) de Peter Bogdanovich
De uma forma ou de outra, o cinema parece ser o grande protagonista nos seus filmes. Bogdanovich será, provavelmente, um dos cinéfilos mais incuráveis da geração dos movie brats, o que quer dizer que vive assombrado pelos grandes clássicos - tanto ou mais do que, por exemplo, um De Palma ou um Scorsese... O que corre por entre as paisagens e os rostos de "Last Picture Show" e deste "Paper Moon" que não uma genuína sentimentalidade clássica? Como dizia Jean Baudrillard, reportando-se ao primeiro, nada diria que estávamos a ver uma obra dos anos 70; poderia muito bem ser um filme dos anos 50, mas não é, definitivamente, um "filme de época".
Confesso que sentimento semelhante só tive aquando do visionamento de "The House of the Devil" de Ti West, filme que, não tendo NADA a ver com o universo formal e temático de Bogdanovich, se reporta aos anos 80 sem fazer disso qualquer tipo de pretexto nostálgico-revivalista, pelo contrário, "naturalizando" de tal maneira os sinais desse tempo, que surge como um filme "mais eighties" que muitos filmes que se fizeram na década dos coletes e dos walkmen.
Poder-se-ia dizer o mesmo de um "Last Picture Show" ou "Paper Moon": não são filmes "passados" nos anos 40/50, são antes, e sem fazer disso mais do que aquilo que é, são filmes dos anos 40/50, que se desenrolam ou não nesse período (no caso da acção de "Paper Moon" estamos no período da Grande Depressão, por exemplo). E é a partir desses anos, já de si de começo de despedidas do glamour do star system, da brincadeira adulta (muito adulta) dos grandes géneros cinematográficos, primeiras sementes de uma nova era que culminaria, precisamente, com o nascimento da geração de Bogdanovich... digo, é a partir desses anos em que este começou a ser mimado pela Sétima Arte que o realizador norte-americano desenvolve o seu próprio cinema.
O habitat de Bogdanovich são os grandes clássicos, mais especificamente, neste "Paper Moon" - mas também em "What's Up Doc?" ou mesmo no subvalorizado "Daisy Miller" -, são os diálogos fulminantes, as personagens (femininas) astutas, as intrigas rebuscadas dos grandes clássicos screwball (de Hawks, de Capra, de Sturges, de Cukor). Tatum O'Neill, a pequena endiabrada Addie Loggins, arrasta o seu suposto pai, que não assume a paternidade..., o burlão Moses Pray (Ryan O'Neill) para uma aventura "on the road" cheia de pequenos, e deliciosos, contra-tempos maquinados por essa criança com alma de adulto, ou melhor, que sabe como fermentar a sua inteligência aguçada com o seu espírito de criança - aquele que vê mais longe que o dos adultos, aquele que, como talvez só Mark Twain soube verbalizar, faz da sua condição "menor" motivo para auspiciosos "negócios" com os adultos apatetados pela vida.
Bogdanovich filma maravilhosamente esta screwball on the road, com uma distinção, sobriedade e, acima de tudo, uma justa medida muito dignas dessa tal "sentimentalidade" - que não se deve confundir com sentimentalismo - nascida das profundezas de uma vivência intensa do grande cinema clássico. "Paper Moon" não é, por isso, um filme nostálgico; é um filme clássico, com as "impurezas" dos anos 70 é certo, mas é, de facto, um filme clássico que não vive de qualquer truque pós-moderno auto-celebratório. Não, nisso Baudrillard tinha muita razão: quantos não errarão hoje ao tentarem adivinhar o ano da estreia de "Paper Moon"? E, por outro lado, caso errem ou acertem, o que é que isso importa?
sexta-feira, 19 de agosto de 2011
O filme do ano (XVII): carpinteiros da fé
Já o temos disponível, em Blu-ray e tudo, nos States, mas, por outro lado, o último Carpenter já tem "quarto" reservado no próximo MOTELx
OBRIGADO! É com este tipo de textos que vou alimentando a minha fé.
[Infelizmente, os fãs de Carpenter que tenho ouvido ou lido atentamente que não gostaram de "The Ward" são grandes apreciadores de "Ghosts of Mars", o que (repito-me) me deixa algo apreensivo...
E sim, Raimi é respeitável, mas pôr o seu nome na mesma frase que o nome de Carpenter é qualquer coisa que só se pode admitir para dizer que não se pode pôr o nome de Raimi numa frase onde esteja o nome de Carpenter. Period.]
quarta-feira, 17 de agosto de 2011
Catch-22 (1970) de Mike Nichols
"Catch-22", filme demencial como poucos sobre o absurdo da guerra, exercício visual que parece ir beber à feição mais tresloucada das novas vagas (exemplo de "Bariera" de Skolimowski ou dos filmes de Jíri Menzel ou Chytilová), ao mesmo tempo que procura afundar ainda mais o negrume de um "Dr. Strangelove". Esta obra-prima de Mike Nichols, ao pé da qual "MASH" é um filme insosso, condimenta assim o contexto da II Guerra Mundial, disputada a partir de uma base aérea virada para o Mediterrâneo, uma "concentração" de militares que, sem hesitar, se consideram "idiotas" e que, por isso, de acordo com o Artigo 22, não podem ser considerados "inaptos para voar" pelo departamento médico, que os vai mantendo assim disponíveis para, como carne para canhão, serem lançados em sucessivas missões mais ou menos sem sentido, mais do que menos suicidárias, além-Mediterrâneo - apesar de algumas bombas lançadas para o mar lhes valerem uma medalha ao peito!
O protagonista, interpretado pelo grande Alan Arkin, alega insanidade mental para não voar mais, mas não vê o seu pedido satisfeito, por causa precisamente do tal Artigo 22, que estabelece a seguinte norma: qualquer militar que se diz incapaz de combater por razões de saúde mental, está apto a combater, pois revela sanidade suficiente para alegar que não está apto a combater. Ou seja, quem não pede dispensa - e está demente - encontra-se habilitado a voltar para casa, o que não acontecerá pois não pediu dispensa - porque se pedisse... etc. e etc.
O que Mike Nichols vai desmontando a cada minuto é o grau de loucura já presente na estrutura que administra todo o esforço de guerra, na realidade, e muito acerbamente, o que nos vamos dando conta é da natural, logo, diríarmos, muito humana - sã patologia? - degenerescência mental dos militares inseridos num sistema que perpetua a lógica perversa vertida, logo de raiz, na sua própria normatividade, como uma ideologia do caos e da insanidade que vê na guerra lugar perfeito para a sua legitimação moral. O que, penso eu, Mike Nichols procura "espantar" com esta poderosa sátira anti-guerra é que não se pode vencer a imoralidade da guerra com a moralidade da Paz; para se "digerir" os tempos mais ou menos mortos do conflito e amortecer os efeitos desumanizadores de uma situação-extrema a melhor via é começar por se falar na mesma língua. Por isso é que qualquer espectador normal sairá desconCertado e desconSertado com a linguagem (de forma e conteúdo) que se ensaia em "Catch-22".
terça-feira, 16 de agosto de 2011
O serviço público de televisão e o "problema" dos conteúdos
Só mesmo desligada, a televisão parece devolver o nosso (exigente) reflexo - a personagem de Jane Wyman em "All that Heaven Allows" (1955) decerto já o sabia.
Anda aí a circular a ideia de que se pode definir o conceito de serviço público de televisão sem se falar de conteúdos e grelhas de programas. Quem tem reagido com esta ideia à constituição do grupo de trabalho chefiado por João Duque, e que integra, entre outros, Eduardo Cintra Torres e Manuel Villaverde Cabral (dois subscritores da nossa petição), arrisca-se seriamente a cair num vazio de argumentos. O Governo tem obviamente de analisar conteúdos específicos se quer aprimorar (ainda mais) o conceito de serviço público.
Aliás, vou até mais longe, dificilmente se consegue falar de televisão sem falar de conteúdos, opções editoriais e mesmo das pessoas que as tomam... Por tudo isto, seria importante "desmascarar" todos aqueles que (epidérmica e demagogicamente) reagem a tudo o que são propostas para acertar o rumo dos canais do Estado e aproximá-los de uma ideia mais concreta de "interesse público" como se estas resultassem automaticamente numa ingerência ilegal, inconstitucional, das forças políticas no direito sagrado à liberdade de imprensa. É preciso, na realidade, tratar de conteúdos, se alguém quer, de facto, uma televisão pública responsável perante a lei e o Contrato que tem com o Estado.
Recomendo que se leia o Contrato que a RTP tem com o Estado para se perceber, de uma vez por todas, primeiro, que o Estado sempre tratou de conteúdos, sempre, por assim dizer, "ingeriu" no modo como as grelhas de programas se constituem e que, segundo, a actual definição de serviço público é já suficientemente exaustiva para que hoje pudéssemos ter uma televisão de muito melhor qualidade - que não oferecesse, pelo menos, tanta contestação por parte da sociedade civil informada. O problema, repito, está na regulação, que deve começar logo na nomeação de quem vai para a frente dos ditos canais. Lamento que, face às evidências, ainda se perca tempo com argumentos corporativistas ou partidariamente viciados.
Aliás, vou até mais longe, dificilmente se consegue falar de televisão sem falar de conteúdos, opções editoriais e mesmo das pessoas que as tomam... Por tudo isto, seria importante "desmascarar" todos aqueles que (epidérmica e demagogicamente) reagem a tudo o que são propostas para acertar o rumo dos canais do Estado e aproximá-los de uma ideia mais concreta de "interesse público" como se estas resultassem automaticamente numa ingerência ilegal, inconstitucional, das forças políticas no direito sagrado à liberdade de imprensa. É preciso, na realidade, tratar de conteúdos, se alguém quer, de facto, uma televisão pública responsável perante a lei e o Contrato que tem com o Estado.
Recomendo que se leia o Contrato que a RTP tem com o Estado para se perceber, de uma vez por todas, primeiro, que o Estado sempre tratou de conteúdos, sempre, por assim dizer, "ingeriu" no modo como as grelhas de programas se constituem e que, segundo, a actual definição de serviço público é já suficientemente exaustiva para que hoje pudéssemos ter uma televisão de muito melhor qualidade - que não oferecesse, pelo menos, tanta contestação por parte da sociedade civil informada. O problema, repito, está na regulação, que deve começar logo na nomeação de quem vai para a frente dos ditos canais. Lamento que, face às evidências, ainda se perca tempo com argumentos corporativistas ou partidariamente viciados.
segunda-feira, 15 de agosto de 2011
História de amor e saúde (existencial e profissional)
Lars von Trier, "Antichrist" (2009)
Não era a diferença de idades - cerca de dez anos -, o problema era aquilo a que se poderá chamar diferença de saúdes. Theodor, sendo médico, mais do que saudável (homem robusto e repleto de energia) era ainda alguém que exigia a saúde ao seu lado, quer profissionalmente - era essa, aliás, a sua missão: o médico exige saúde aos seus pacientes, impõe-na mesmo, através de medicamentos, operações, etc. - quer existencialmente, se assim se pode dizer. Ele queria - desejava - a saúde ao seu lado, à volta, encostada a ele.
Gonçalo M. Tavares, Jerusalém (2004) - obra inserida na série O Reino -, Caminho, 2008, p. 57
Não era a diferença de idades - cerca de dez anos -, o problema era aquilo a que se poderá chamar diferença de saúdes. Theodor, sendo médico, mais do que saudável (homem robusto e repleto de energia) era ainda alguém que exigia a saúde ao seu lado, quer profissionalmente - era essa, aliás, a sua missão: o médico exige saúde aos seus pacientes, impõe-na mesmo, através de medicamentos, operações, etc. - quer existencialmente, se assim se pode dizer. Ele queria - desejava - a saúde ao seu lado, à volta, encostada a ele.
Gonçalo M. Tavares, Jerusalém (2004) - obra inserida na série O Reino -, Caminho, 2008, p. 57
domingo, 14 de agosto de 2011
Blu-ray ou a "alta-indefinição" (II)
Apesar de tudo, para nós, cinéfilos, assumidos ou não assumidos coleccionadores de filmes, pode-se já dizer que o Blu-ray tem propiciado algumas edições ou mesmo reedições que se exigiam há muito. Exemplo disso é "El sur", filme que Erice já viu editado em DVD, mas que estava descatalogado há bastante tempo. Agora, a FNAC espanhola, na senda daquilo que eu defino como uma estratégia "alternativa" ao DVD, lançou "El sur" com "El espirítu de la colmena" (edição destacada na nossa Newsletter), obra-prima mais fácil de encontrar no mercado DVD - nomeadamente no catálogo da Criterion. Temos aqui o exemplo de uma editora/loja que aproveitou o contexto de conversão para o Blu-ray para FAZER POR lançar algo que estava em falta no mercado DVD.
Também poderá ser no formato Blu-ray que cinematografias menos conhecidas poderão entrar no difícil mercado americano. Estou a pensar, para o caso, do lançamento de "O Estranho Caso de Angélica", nos Estados Unidos, a partir do dia 20 de Setembro. Não é o primeiro Oliveira a ser editado na terra de John Ford, mas o factor Blu-ray emprestará a este lançamento uma marca de "acontecimento" que nenhum lançamento de um filme português mereceu ainda nesse mercado. Destino semelhante deverá ter o muito elogiado "Mistérios de Lisboa", obra quase feita a pensar na alta-definição, ou no home cinema de luxo.
O que impede ou entrava a difusão internacional destes filmes é, para mal dos nossos pecados, a velha história das regiões, que não é ultrapassada na transição para o novo formato. Um anacronismo idiota, face à crescente universalização do mercado de filmes, nomeadamente através do cada vez mais desenvolvido comércio online. A questão das regiões ou zonas, que, no caso da alta-definição, divide o mundo em letras do alfabeto (nós somos B e os americanos A, por exemplo), permanece e não é de fácil resolução para o cinéfilo comum. Pessoalmente, resolvi aventurar-me na compra de um leitor multizonas, o que me saiu mais caro do que se me tivesse resignado à ditadura das zonas. O mercado tem procurado dar a volta a este "contra" com edições "region free", um pouco como também se fizera com os DVDs numa fase inicial, contudo, este é um problema que só vem assombrar (lá vamos nós fazendo figas para que não seja zona A) quem, por exemplo, estando em Portugal, queira saborear o seu primeiro Oliveira em Blu-ray - algo que, está visto, será mais rapidamente possível nos Estados Unidos do que cá.
sábado, 13 de agosto de 2011
Blu-ray ou a "alta-indefinição" (I)
"Early Summer", segunda parte da Trilogia de Noriko de Yasujiro Ozu... e o meu primeiro Blu-ray
Neste meu post número 600 resolvi escrever algumas impressões quanto ao novo formato de visionamento caseiro de filmes: o Blu-ray. Algumas coisas têm sido escritas sobre as qualidades técnicas, umas valorizando, outras desvalorizando, desta nova tecnologia. Não sendo propriamente um especialista, remeto este comentário à minha experiência pessoal e a alguns apontamentos críticos que já tenho deixado noutros espaços sobre o assunto Blu-ray vs. DVD.
Vi o meu primeiro Blu-ray recentemente e, desde já, devo dizer que foi uma experiência comovente. Não tanto por ser - que não é... - um salto qualitativo tão grande como aquele que aconteceu com o DVD em relação ao VHS, mas pelo facto do Full HD emprestar a filmes com uma certa idade uma definição em profundidade tal que nos dá a ilusão de que o tempo não as castigou tanto quanto pensado - e, especialmente no cinema clássico japonês, nós sabemos como tanta obra-prima chega hoje até nós em condições lastimosas.
Ao mesmo tempo, ver o filme que vi, "Early Summer" de Ozu, é testemunhar a "reposição" de algumas das características originais da imagem, numa viagem de mais de cinquenta anos pela história, restaurando - e dando-me a ver, de forma plena, pela primeira vez - a riqueza visual dos planos de um cineasta tão subtil como o grande mestre nipónico.
Se este não é um "contra" do Blu-ray, apetece, no entanto, acrescentar, em jeito de crítica à indústria, a seguinte observação: a quem quer continuar a ver os blockbusters saídos recentemente ou as pipocadas que por aí andam, não creio que seja muito vantajoso se precipitar na compra do Blu-ray. É por isso que me espanto que o Blu-ray esteja a ser vendido, cá em Portugal, como de resto, em todo o lado, primeiramente como uma tecnologia "para as massas", um substituto (não confundir com "alternativa") mainstream do home cinema tradicional. Eu diria que o Blu-ray, em termos cinematográficos, veio para ficar, mas, ao contrário do que se possa pensar, penso que só "ficará" se souber "vender" todas as suas potencialidades aos cinéfilos exigentes, que procuram as transcrições mais cristalinas dos grandes clássicos do cinema. O Blu-ray poderá ser, a médio prazo, o grande instrumento de revisitação estética da história do cinema - de "reescrita" mesmo dessa história - mas como "atestador" das qualidades e defeitos das grandes produções dos nossos dias, aquelas de que é feito o boxoffice mundial, não passa de um "novo-riquismo" sem relevância.
Uma das críticas que eu, enquanto cinéfilo, sempre coloquei à perspectiva da imposição de um formato substituto do DVD - e não "alternativo" - é o facto de, com essa substituição, por apenas um capricho "novo-riquista" das massas sedentas por novos gadgets inconsequentes, se dar um grave passo atrás num processo, que considero muito importante, de escavação da história do cinema.
A corrente arqueologia audiovisual, feita com o maior dos cuidados por marcas como The Criterion Collection, Second Run, BFI, Masters of Cinema, Carlotta, )intermedio(, MIDAS, etc., arrisca-se a regredir violentamente, a mando das novas exigências de conversão à alta-definição. A Criterion, por exemplo, tem-se apressado a descatalogar algumas edições antigas - em DVD -, ao mesmo tempo que lança filmes (primeiras edições mas muitas reedições) nos dois formatos, separadamente. Já a BFI arranjou a solução - muito expedita - de vender edições em dual format, sem que isso afecte sobremaneira o preço das mesmas - "Early Summer" foi dos primeiros a ser lançado neste modo.
Se estas editoras têm feito a conversão de forma inteligente, sabendo nomeadamente como "revisitar" de modo quase irresistível alguns grandes clássicos - veja-se a edição de "The Red Shoes" pela Criterion, um trabalho fenomenal de restauro cinematográfico -, também é certo que têm ocupado mais tempo a "olhar para trás" no seu catálogo, do que a proprocionar novas e mais arrojadas ofertas. O mercado transborda de "reedições", os filmes - nalguns casos, os "filmes de sempre" - são revendidos no novo formato como se estivessem a ser dados a ver ao público pela primeira vez - e, como já disse, em muitos casos, tecnicamente, as novas cópias não são merecedoras de grande euforia...
Dir-me-ão: ah, mas isto agora é mais simples, tendo um catálogo rico de DVDs, é só fazer a conversão dos mesmos para Blu-ray e reduzir ligeiramente o ritmo de lançamentos totalmente novos. Pode ser que sim, mas se virmos o caso da passagem do VHS para o DVD, constatamos que muitos filmes, por exemplo, constantes do catálogo VHS da Artificial Eye não foram lançados sequer em formato DVD (penso, nomeadamente, em "A Mãe e a Puta" de Jean Eustache, mas há vários). O mesmo se poderia dizer dos VHS da New Yorker Films, marca que, quando transitou para o DVD, esteve poucos anos em actividade. Naturalmente que o Blu-ray também implicará uma reestruturação do mercado, isto é, algumas editoras não resistirão a este período (com avanços e recuos, muita precipitação e muita hesitação... ) de transição.
De qualquer modo, também me parece que o Blu-ray não será o novo "laser disc". Digo isto, porque o mercado, sobretudo americano, começa gradualmente a abandonar o DVD mas sem "sentenças de morte" definitivas (exemplo dos tais "dual formats") e, factor essencial, os preços dos leitores estão já em valores bastante acessíveis. Na realidade, tanto os aparelhos como os discos Blu-ray têm visto descidas de preço tais que, neste momento, nalguns (excelentes) casos, é mais vantajoso comprar no novo formato que em DVD. Basta espreitar os pré-lançamentos Blu-ray nos Estados Unidos para vermos sonantes edições de filmes, nomeadamente, de Tarantino a preços que rondam os 10 dólares, bem abaixo dos pré-lançamentos típicos em DVD - ou, se quiserem, atente-se ao preço da ainda mais impressionante edição de 4 discos de "Donnie Darko", na celebração dos seus dez anos. Também os Criterions em alta-definição têm merecido várias promoções nas lojas americanas, estando, muitas vezes, a preços mais acessíveis que a sua versão em DVD - caso do já citado "The Red Shoes". (Muitas outras promoções Blu-ray serão referidas na próxima Newsletter.)
Claro que, ao mesmo tempo, também os DVDs nunca estiveram tão baratos, logo, a tentação de os comprar nunca foi tão grande. Penso que estas tendências - tentativa de afirmação do Blu-ray versus embaratecimento dos DVDs - se resolvem na nova tecnologia com a capacidade que esta tem de ler DVDs - daí eu pensar que a nova tecnologia devia ser vista mais como uma "alternativa" ao DVD do que um substituto deste... E daí a solução interessante que constituem as edições em dual format que a BFI tem lançado. Para o mercado nacional, para marcas como a MIDAS Filmes ou a CLAP Filmes, seria menos arriscado enveredar por uma solução desta natureza. É mais por aí que a conversão poderá ser frutuosa para todos e a regressão na tal "arqueologia audiovisual" não se sentirá tão fortemente - afinal, reedita-se ou edita-se pela primeira vez logo nos dois formatos, tornando a edição mais "durável" no mercado.
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
As introduções de José Vieira Mendes: o grau zero da contextualização cinéfila
A questão do cinema e do serviço público de televisão é complexa, não devido às obrigações quantitativas e qualitativas previstas no Contrato de Concessão de Serviço Público, mas pelo facto de, verdadeiramente, "o problema" ser de muito difícil resolução por quem tem "programado como tem programado" os espaços de cinema nos canais públicos. Quero dizer com isto o seguinte: mesmo que Jorge Wemans ou alguém que partilhe com este uma visão muito estreita do que é e representa o cinema para o público da RTP2, digo, mesmo que alguém DESTA RTP2, ligada umbilicalmente a ESTA direcção, se proponha dar o tal "passo em frente" na sua programação de cinema, provavelmente, dará apenas meio passo.
No debate Cinema na RTP2 foi assumido pelo director da estação, bem como pelo ex-Provedor do Telespectador, que este canal está claramente deficitário no campo da sua programação de cinema. E que o problema, mais do que quantitativo, é qualitativo. Alguns elementos do público que quiseram participar no debate não deixaram de fazer a sugestão mais óbvia: que, pelo menos, a sessão dupla dos sábados seja pensada por alguém da área, que depois fará uma pequena introdução filmada - ela ou um convidado... - aos filmes que se seguem. A ideia pareceu ter sido bem recebido por todos os presentes. Naquele momento estávamos todos de acordo. Contudo, é preciso sublinhar que esta solução "mínima" poderá ser menos do que isso se o formato dessa apresentação for, à partida, ele mesmo, "equívoco", isto é, pouco compaginável com as exigências de qualidade, intelectual e pedagógica, que efectivamente SERVEM o interesse público. Por isso é que, mesmo que o senhor Jorge Wemans queira dar, finalmente, o tal passo em frente, cairá no risco de só dar meio passo.
Exemplo desse "meio passo" que, se calhar, nem "em frente" nos (co-)move, é o espaço que a RTPMemória organiza todas as semanas - penso - e que é apresentado pelo director da revista PREMIERE, José Vieira Mendes. Aqui está um caso que parece encaixar-se em todas as nossas exigências: alguém do cinema que apresenta um grande clássico, faz dessa apresentação oportunidade para se falar sobre cinema com um convidado em estúdio, servindo o apresentador/entrevistador de anfitrião na descoberta das preciosidades mais ou menos escondidas da História do cinema.
Tudo bem? Sim, mas só em teoria. O problema vem, então, com a qualidade não só da apresentação, como da entrevista. Qualquer coisa tão confrangedora que dificilmente se consegue reproduzir neste espaço. O apresentador empresta um sorriso de plástico e um conjunto de perguntas "com rasteira", frequentemente eivadas de insinuações pequeninas, seja contra o cinema português, seja contra o cinema dito "alternativo", que, naturalmente, levam o convidado a responder com a mesma moeda. Inanidades atrás de inanidades, portanto. E, como digo, José Vieira Mendes baixa qualquer conversa a uma espécie de grau zero do pensamento cinematográfico, insistindo nas questões de indústria, bem como falando do número de prémios que os filmes conquistaram ou de outro tipo de futilidades debilmente debitadas num português paupérrimo. (Numa das introduções pergunta ao convidado, um programador que gosta tanto de cinema como política e outras coisas, como consegue este harmonizar uma oferta mainstream com a oferta de blockbusters...).
Com efeito, quase tudo o que este senhor diz surge como absolutamente lateral ao filme que irá ser mostrado e que, pelo seu valor estético e histórico, pedia uma publicitação, pelo menos, digna da parte do canal que o exibe. Neste sentido, João Lopes faz muito mais do que RTPMemória e RTP2 juntas sempre que fala de um DVD de um clássico da Sétima Arte que saiu nessa semana - aqui sim, há um pensamento que se transmite, um convite informado e "informante" ao espectador para mergulhar mais fundo na história das imagens...
Por outro lado, ou como consequência lógica de tudo isto, os convidados estão ali como que caídos de pára-quedas. Nas "introduções" que tenho assistido, é evidente que a personalidade escolhida está ali mais para uns minutinhos de auto-promoção e tiradas cúmplices com "as ideias" do apresentador do que, verdadeiramente, para contextualizar o filme que se vai mostrar a seguir ao espectador. Resulta disto que, nalguns casos, pela própria, correspondente aliás, pobreza do discurso de alguns convidados, o filme fica praticamente por apresentar - ele parece estorvar aliás o fio de raciocínio, raciocínio baseado em trivialidades ou verdadeiras tolices demagógicas, que envolve estas conversas de café absurdamente deslocadas do seu objecto.
É também notório que não são os convidados a escolher os filmes, mas o apresentador que "impinge" os filmes a convidados que, por partilharem as suas "visões" do cinema, vão à televisão pública trocar umas impressões vãs sobre o que se vai mostrar, mas, acima de tudo, sobre o "estado do cinema" no nosso país - na vez de Pedro Mexia, que parece "fazer carreira a falar mal do cinema português", fica claro que, se pudesse escolher, este apresentava "The Searchers" no lugar de "How Green Was My Valley", obra que lhe saiu na rifa semanal, sorteada por José Vieira Mendes.
No fim, o apresentador, com um sorriso de plástico, despede-se do convidado e do espectador, "lendo" no teleponto um texto miseravelmente escrito, que mata de vez com a possibilidade de a RTP fazer do cinema, finalmente, espaço de reflexão cuidada sobre as imagens e o seu lugar na história contemporânea.
No debate Cinema na RTP2 foi assumido pelo director da estação, bem como pelo ex-Provedor do Telespectador, que este canal está claramente deficitário no campo da sua programação de cinema. E que o problema, mais do que quantitativo, é qualitativo. Alguns elementos do público que quiseram participar no debate não deixaram de fazer a sugestão mais óbvia: que, pelo menos, a sessão dupla dos sábados seja pensada por alguém da área, que depois fará uma pequena introdução filmada - ela ou um convidado... - aos filmes que se seguem. A ideia pareceu ter sido bem recebido por todos os presentes. Naquele momento estávamos todos de acordo. Contudo, é preciso sublinhar que esta solução "mínima" poderá ser menos do que isso se o formato dessa apresentação for, à partida, ele mesmo, "equívoco", isto é, pouco compaginável com as exigências de qualidade, intelectual e pedagógica, que efectivamente SERVEM o interesse público. Por isso é que, mesmo que o senhor Jorge Wemans queira dar, finalmente, o tal passo em frente, cairá no risco de só dar meio passo.
Exemplo desse "meio passo" que, se calhar, nem "em frente" nos (co-)move, é o espaço que a RTPMemória organiza todas as semanas - penso - e que é apresentado pelo director da revista PREMIERE, José Vieira Mendes. Aqui está um caso que parece encaixar-se em todas as nossas exigências: alguém do cinema que apresenta um grande clássico, faz dessa apresentação oportunidade para se falar sobre cinema com um convidado em estúdio, servindo o apresentador/entrevistador de anfitrião na descoberta das preciosidades mais ou menos escondidas da História do cinema.
Tudo bem? Sim, mas só em teoria. O problema vem, então, com a qualidade não só da apresentação, como da entrevista. Qualquer coisa tão confrangedora que dificilmente se consegue reproduzir neste espaço. O apresentador empresta um sorriso de plástico e um conjunto de perguntas "com rasteira", frequentemente eivadas de insinuações pequeninas, seja contra o cinema português, seja contra o cinema dito "alternativo", que, naturalmente, levam o convidado a responder com a mesma moeda. Inanidades atrás de inanidades, portanto. E, como digo, José Vieira Mendes baixa qualquer conversa a uma espécie de grau zero do pensamento cinematográfico, insistindo nas questões de indústria, bem como falando do número de prémios que os filmes conquistaram ou de outro tipo de futilidades debilmente debitadas num português paupérrimo. (Numa das introduções pergunta ao convidado, um programador que gosta tanto de cinema como política e outras coisas, como consegue este harmonizar uma oferta mainstream com a oferta de blockbusters...).
Com efeito, quase tudo o que este senhor diz surge como absolutamente lateral ao filme que irá ser mostrado e que, pelo seu valor estético e histórico, pedia uma publicitação, pelo menos, digna da parte do canal que o exibe. Neste sentido, João Lopes faz muito mais do que RTPMemória e RTP2 juntas sempre que fala de um DVD de um clássico da Sétima Arte que saiu nessa semana - aqui sim, há um pensamento que se transmite, um convite informado e "informante" ao espectador para mergulhar mais fundo na história das imagens...
Por outro lado, ou como consequência lógica de tudo isto, os convidados estão ali como que caídos de pára-quedas. Nas "introduções" que tenho assistido, é evidente que a personalidade escolhida está ali mais para uns minutinhos de auto-promoção e tiradas cúmplices com "as ideias" do apresentador do que, verdadeiramente, para contextualizar o filme que se vai mostrar a seguir ao espectador. Resulta disto que, nalguns casos, pela própria, correspondente aliás, pobreza do discurso de alguns convidados, o filme fica praticamente por apresentar - ele parece estorvar aliás o fio de raciocínio, raciocínio baseado em trivialidades ou verdadeiras tolices demagógicas, que envolve estas conversas de café absurdamente deslocadas do seu objecto.
É também notório que não são os convidados a escolher os filmes, mas o apresentador que "impinge" os filmes a convidados que, por partilharem as suas "visões" do cinema, vão à televisão pública trocar umas impressões vãs sobre o que se vai mostrar, mas, acima de tudo, sobre o "estado do cinema" no nosso país - na vez de Pedro Mexia, que parece "fazer carreira a falar mal do cinema português", fica claro que, se pudesse escolher, este apresentava "The Searchers" no lugar de "How Green Was My Valley", obra que lhe saiu na rifa semanal, sorteada por José Vieira Mendes.
No fim, o apresentador, com um sorriso de plástico, despede-se do convidado e do espectador, "lendo" no teleponto um texto miseravelmente escrito, que mata de vez com a possibilidade de a RTP fazer do cinema, finalmente, espaço de reflexão cuidada sobre as imagens e o seu lugar na história contemporânea.
O filme do ano (XVI)
A fé tem vindo notoriamente a esmorecer? Talvez, mas não morreu completamente. "The Ward", filme que neste blogue tenho apelidado (antes do tempo...) de "o acontecimento do ano", tem recebido as reacções mais negativas mesmo junto dos fãs carpenterianos mais empedernidos.
A desilusão em torno deste filme tem baixado as expectativas de quem quer perseverar para o ver no grande ecrã, em condições certas para, então sim, emitir qualquer juízo. A verdade é que, neste momento, o hype morreu. O que o pode reacender? Provavelmente um contexto cinéfilo propício à adoração do cinema de terror, uma atmosfera que faz inveja a qualquer outro festival de cinema da capital. Falo, naturalmente, do incontornável MOTELx, festival de cinema de terror que invade o S. Jorge para arrefecer a espinha a qualquer Verão quente que se preze...
A próxima edição desta excelente montra do horror contará, então, com a estreia nacional de "The Ward" de John Carpenter. Será, certamente, o espaço mais adequado para gostarmos ou mesmo para "não gostarmos" (suposição que, neste momento, ainda me deprime...) do próximo filme do genial realizador. A eventual presença do insuportável Eli Roth (o realizador/actor homenageado este ano) não me deterá nesta prova dos nove que tem tanto de entusiasmante como, já, de angustiante.
domingo, 7 de agosto de 2011
sábado, 6 de agosto de 2011
Newsletter #6: Rocha
Glauber Rocha entrou cá por casa como uma virose, cuja cura passa por "escavar" o mais que podemos a vida e obra desta figura tão particular na história do cinema; figura de proa do novo cinema brasileiro ou, mais ainda, líder proeminente de um cinema "não-alinhado" feito a partir das terras, fustigadas de injustiças, marcadas pelo "esquecimento", do Sul pobre, contra o Norte rico, super-capitalizado e autista. Seremos, então, meio-subversivos em Setembro, talvez na esperança que o espírito rochiano faça dos ventos deste Verão frio de Agosto oportunidade única para a Reforma das almas massacradas pela poluição mediática destes dias e a previbilidade constante da paisagem...
Para além do nosso espaço dedicado ao "herói do mês", propomos várias novidades em matéria de livros e filmes. Por exemplo? Podemos adiantar que iremos dar eco ao lançamento - que poderá fazer história - do trabalho de uma fotógrafa de rua nova-iorqunia que, fora de qualquer círculo de influências e sob um "auto-preservado" anonimato, desenvolveu um trabalho único desde os anos 50.
Iremos falar de filmes que estão a sair no mercado nacional e internacional, com especial destaque para nomes como Malick, Kaplanoglu, Angelopoulos, De Sica, irmãos Coen, Michael Mann, etc. Não nos esqueceremos de incluir as já costumeiras pechinchas e grandes descobertas, tanto em matéria de filmes (exemplo de caixas de Bong Jon-ho, de Helma Sanders-brahms, de Jean Renoir...), como em matéria de literatura ligada ao universo das imagens e da filosofia (exemplo de obras de David Deutsch, Peter Sloterdijk, Slavoj Zizek, Bruno Latour, etc.).
Para além de todas as demais rubricas habituais (filmes na TV, loja do mês e, quiçá, alguns exclusivos), não percam também as sugestões do mês dadas pela programadora e jovem cineasta Inês Sapeta Dias.
Íamos escrever "absolutamente a não perder", mas não queremos parecer engraçadinhos - nem maus plagiadores -, por isso, apenas deixamos o apelo solene e mui respeitoso para que não percam a sexta edição da Newsletter do CINEdrio.
Fui.
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