A mise en scène de Victor Sjöström faz isto a "The Wind" (1928): transforma uma narrativa americana relativamente banal num bailado de corpos que vai sendo moldado pelo vento, o grande elemento dramático e psicológico do filme. É ele que puxa as personagens para o filme - veja-se a forma como a protagonista, Letty (Lillian Gish), é "aspirada" pela força do vento, logo nos primeiros minutos. Mais, é ele que (des)organiza a vida das personagens num fatídico triângulo amoroso: dois homens disputam uma mulher que não os ama; ou melhor, Letty deixou de amar um e ainda não sabe que ama o outro.
Ela é violada pelos dois: o primeiro assedia-lhe com um beijo não consentido, numa sequência de tensão, com a câmara apontada para os pés, que lembra Hitchcock; o segundo aproveita-se perversamente do estado catatónico de Letty e a insinuante elipse que Sjöström desenha indica-nos que a gravidade do que ele lhe faz vai muito além de um "beijo não consentido". Até porque, na sequência seguinte, Letty toma, num ímpeto, as rédeas do filme: torna-se na única personagem que mata em "The Wind" e que, como resultado, ganha coragem para enfrentar o vento, numa espécie de reconciliação com o amor e a natureza (a que vive, indomável, dentro de si e à sua volta).
O último plano, dos mais belos, parece o de um western tout court: depois do sacrifício, uma Letty segura de um amor forjado pelo Destino entrega-se ao vento. Quando esta diz que já não tem medo do vento - que se acostumou a ele - fica clara a ideia que explanámos anteriormente: o vento de "The Wind" não sopra contra a protagonista; muito pelo contrário, ele é (sempre foi) parte da "sua natureza".
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1 comentário:
Uma das obras máximas - senão a máxima - onde se explora a relação do humano com o natural, numa fusão assustadora e sedutora ao mesmo tempo. É, também, a prova máxima do primado visual do cinema. O som ali é todo dado pela imagem - e que sons!
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