O balanço desta iniciativa por um serviço público de qualidade que respeite o espectador e que faça de uma programação cultural oportunidade que não se pode esbanjar de fornecer as ferramentas críticas e conceptuais para que o português médio se possa "defender" do que vê, das imagens que o bombardeiam, a toda a hora, no seu dia-dia, digo, o balanço deste movimento cívico, surgido ESPONTANEAMENTE, sem recados ou objectivos que não sejam mais do que aquilo que está no texto da petição - mais cinema! mehor cinema! mais cultura! -, que SABE separar as águas entre o que é a televisão pública - seguramente não uma finalidade em si mesma - e o serviço público - este sim, um "fim" significativo que nos moveu -, digo, o balanço desta parceria entre bloggers de cinema - nem propriamente os mais "populares", sem nome mediático ou redes de contactos mediáticas... -, digo, o balanço deste debate entre o verdadeiro público da RTP2 e a administração plantada há quase 5 anos num lugar que, por todas as razões, exigia rotatividade e abertura, digo, o balanço destes vários meses de reflexão, escrita, filmada, trocada em mensagens, fomentada em encontros informais, etc... sempre em torno da problemática, complexa, admitimo-lo, do serviço público, digo, o balanço deste verdadeiro teste à democracia, nomeadamente, à forma como DE FACTO os agentes políticos e as entidades reguladoras estão disponíveis a ouvir quem DEVIAM representar, a dita "sociedade civil", muito elogiada sobretudo quando não "incomoda", que em todos os lados ouvimos dizer que está "morta" neste país... Digo, o balanço disto tudo é, quanto a mim, negativo.
Estão surpreendidos? Acredito que sim, porque, afinal, reunimos quase 3000 assinaturas; por outras palavras, 5 perfeitos desconhecidos*, zés-ninguém, que escrevem uns posts aqui e ali, conseguiram convocar praticamente todos os sectores da sociedade portuguesa para a resolução de um problema tão específico - será? - como o cinema na televisão pública, melhor, a forma como o cinema NÃO é programado - isto é, é DESprogramado - na RTP2... mesmo depois disto, por que venho agora dizer que o balanço é negativo? Porque, ingenuamente ou não, achámos a certa altura que a nossa causa não só era intrinsecamente justa, como também era praticamente unânime, tendo ganho ressonâncias na sociedade portuguesa como não nos tinha, em qualquer momento, passado pela cabeça. Lembro-me que no primeiro encontro que tive com o Miguel Domingues, no meu espírito, não iríamos conseguir mais do que 200 assinaturas ou coisa parecida. Foi uma feliz surpresa ver como a petição cresceu. Mas desenganem-se aqueles que pensam que cresceu POR ACASO. Todos nós, sobretudo eu, o Miguel Domingues, o Ricardo Lisboa, o João Palhares e o Carlos Natálio trabalhámos imenso para manter minimamente viva a chama ao longo destes meses; muitas vezes numa insistência que, à partida, nos transcendia por completo, abordámos o problema de todos os ângulos, quisemos fazer desta reunião única, e, para sempre!, irrepetível, uma grande oportunidade para tornar imediatamente consequente uma causa nascida, feita a pensar e pela sociedade civil. Quisemos iniciar a discussão da utilidade ou não da televisão pública num campo apartidário, mas não num campo apolítico - bem pelo contrário, nunca deixámos, sem medos, de intervir directamente, convocando todos os agentes com poder e confrontando-os com as suas responsabilidades, coisa que muitos se demitiram de assumir. É aqui que entra a desilusão.
O meio do cinema, altamente tribalizado, comportou-se de forma pequena, muito pouco à altura dos pergaminhos que tanto diz ter e mostrou-se pouco determinado em defender o direito à cultura, isto é, o acesso de todos ao cinema, princípio que só deveria oferecer da sua parte a mais inequívoca e incansável das defesas. Nenhuma organização, instituição privada ou pública nos ajudou ou quis colaborar de forma expressa e substancial nesta causa. A forma como a Associação Portuguesa de Realizadores ignorou por completo esta iniciativa é sintomática de como as gentes do cinema estão muito pouco disponíveis para apoiar iniciativas cívicas desta natureza. Também registamos com desagrado o pouco eco e apoios que obtivemos junto da Cinemateca Portuguesa, de quem acabámos por não merecer uma única assinatura. Seria interessante saber o que pensam estas instituições públicas da forma como a RTP2 tem tratado aquilo que deveriam defender incondicionalmente: o Cinema, precisamente. Numa altura em que a Cinemateca Portuguesa passa por dificuldades, cortes na programação e coisas afins, seria, a nosso ver, mais do que interessante reposicionar-se a RTP2 como um agente cultural, democrático, que promova o acesso do público ao cinema. As instituições devem-se preocupar com os seus problemas, mas nunca o podem fazer abdicando completamente de combater pelo que lhes é estrutural; e o princípio da democratização do cinema na televisão pública pode constituir um relançamento de uma certa "consciência cinéfila" nacional, que leve mais pessoas para a rua, defendendo o serviço público de televisão, a cinemateca e os cineclubes deste país.
Muita gente, de modo cobarde e pouco nobre tendo em conta, para mais, o estado actual do país, não apoiou esta iniciativa com medo de represálias, de cortes nos subsídios por parte da televisão pública e coisas do género. Lamento dizê-lo, mas o cinema português, que está bem servido em matéria de cineastas, está PESSIMAMENTE servido em matéria de cidadania. O comportamento de muita gente com responsabilidades na área é sinal de que Wemans é só a ponta do icebergue de um problema maior que começa com algo que a nós, grupo-peticionário, sempre causou espanto: o facto de durante cinco anos, fora umas trocas boçais de insultos na praça pública e umas conspirações cobardes, quem se diz DEFENSOR DO CINEMA não ter feito nada de visível para contestar a programação do segundo canal, que coerentemente tem arrastado a cultura para a lama - e, como pergunta muito bem o cineasta João Mário Grilo, quem vai agora querer "ir para as ruas" defendê-la contra uma qualquer medida de privatização de parte ou de toda a televisão pública?
E os agentes políticos? Agradecemos a vontade de mudança, ACTUANTE, da bancada do bloco de esquerda, na pessoa da deputada Catarina Martins, mas lamentamos a apatia do PS ou o modo como assobiou para o lado, em vésperas de subir ao poder um partido que - dirá o PS - defende o fim da televisão pública e do serviço público. Ao contrário da deputada Inês de Medeiros, considero que entidades como a AR e a ERC, antes de serem intransigentes na defesa da televisão pública, devem ser intransigentes na defesa do serviço público. Tanto a AR, pela mão da deputada Inês de Medeiros, como a ERC, que não respondeu aos nossos mails, telefonemas e carta, perderam uma enorme oportunidade para mostrarem que o combate que dizem encabeçar pela televisão pública não é fruto apenas de uma circunstância mediática/partidária.
Se a ERC não regula o cumprimento das obrigações de serviço público, se é ingénua na leitura das estatísticas abusivamente manipuladas que a RTP2 apresenta nas auditorias anuais ao canal, se, por outro lado, face a tudo isto, a AR nos diz que é demagógico e "ilegal" qualquer tipo de pressão sobre o segundo canal, porque isso constitui uma intromissão nas decisões editoriais da direcção - o que leva a um vazio de regulação inevitável, visto que, deste modo, a RTP2 poderá continuar a desenvolver impune e orgulhosamente a sua "programação para as audiências", que não se sabe bem que interesses serve... nem se quer imaginar que interesses tem servido... se face a tudo isto, ninguém age ou muda alguma coisa, como podem esperar que os espectadores, a sociedade civil, os contribuintes de onde vem o orçamento da televisão pública, venham defender os seus interesses? Quem nos representa? Nesta matéria, chegámos à conclusão que pouca gente. O bom-senso e independência não imperam nem no meio político nem no meio televisivo nem mesmo entre as "elites" do cinema. O balanço é negativo porque pensamos que, com todos eles, hoje teríamos uma programação de cinema DIGNA no segundo canal.
Desde o início, mesmo não esperando metade da adesão que tivemos, como já referi, sempre tive um único objectivo e mais nenhum: ligar a televisão e ter cinema, um pouco como já tivemos noutros tempos com programas como "5 Noites, 5 Filmes" ou "Filme da Minha Vida" ou, recuando mais, o "Cine-Clube"... A verdade é que, hoje, tendo já entregue as 2962 assinaturas na Assembleia, tendo escrito mais de uma centena de posts, realizado vídeos, podcasts e um debate que tornámos público, nada mudou no segundo canal. Este sábado, em sessão dupla, a esmola que Wemans ainda vai dando ao "público" da RTP2, passam os filmes "Excalibur" de John Boorman, seguido de "A Promessa" de Chen Kaige. O que os liga, o que é que os põe em diálogo? A lenda do rei Arthur encontra ressonâncias na história lendária da China das concubinas? É isso? São as espadas e os cavalos? É Boorman e Kaige? Mas, ó chatos de uma figa, o que é que isso interessa? O povo é ignorante, quer continuar a ser ignorante; enfim, quer é ligar a TV e ver imagens em movimento, acção, acção e poucas palavras, como se diz no filme do outro! A televisão não serve para ser pensada nem para fazer pensar, não é? Está visto que sim. Frank Capra, que sempre se interessou pelas "causas grandes" dos pequenos "sem nome", teria ficado envergonhado com um desenlace destes.
* - Falo, para além de mim, do Miguel Domingues, Ricardo Lisboa, João Palhares e Carlos Natálio. A título pessoal devo dizer que o mais gratificante de tudo foi ter tido a oportunidade de privar com os meus colegas da petição e de perceber que há pessoas de grande valor, que pensam o cinema e que o defendem acima de qualquer interesse.
12 comentários:
Deixo aqui os meus parabéns a toda a equipa da Petição por todo o trabalho feito e, acima de tudo, pela forte insistência em levar a iniciativa para além de um simples passa-palavra. É pena que tenha sido posta de lado, sempre com aquela desculpa do "estamos em crise, há problemas mais importantes".
Pode ser que, daqui a alguns anos, peguem nas propostas aqui feitas. (provavelmente quando o sr. Wemans sair da 2, ou quando a 2 passar a ser outra coisa qualquer)
Obrigado Pedro! Espero que sim, sinceramente. Olho para este grupo de subscritores e ainda fico mais revoltado face à ausência de resultados visíveis! Abraço,
Lamento ler este balanço negativo, sobretudo pelos motivos que "barraram" o sucesso da petição.
Contudo, não posso deixar de salientar uma passagem deste texto, a saber: «O meio do cinema, altamente tribalizado (...)». Na minha opinião, mais do que a quantidade e qualidade da programação de cinema na TV, essa é uma (triste) realidade que tem de ser combatida a todo o custo — não admira que se chegue a medidas como a da futura metodologia de atribuição de fundos a projectos cinematográficos. E se essa luta não começar pelas próprias instituições, então tem de nascer noutro lado. Incluindo com petições.
Parabéns pelo trabalho desenvolvido, acredito que não será totalmente infrutífero.
Cumps cinéfilos.
Os meus parabéns também. Partilho das vossas ideias e tenho pena que realmente não 'sejamos' ouvidos por um governo que ainda tem a coragem de referir que existe uma coisa chamada serviço público em Portugal!
Cumprimentos,
http://cinemaschallenge.blogspot.com/
Infelizmente é assim que se trata o Cinema e a Cultura em Portugal. De qualquer forma a vossa iniciativa merece ser reconhecida por todos os que gostam de cinema, quanto mais não seja por ter promovido o debate em torno desta questão. Pena é que, como em muitos casos, a voz das pessoas nunca seja ouvida por quem deve.
É uma vergonha a forma como o Cinema é tratado hoje em dia na televisão, sobretudo na pública que deveria ser um exemplo. Quando muito se fala em formar públicos cinéfilos, onde é que a RTP 2 contribui para isso actualmente? Custava muito ter, como chegou a ter em tempos idos, filmes apresentados por quem sabe do que fala. Lembro-me de ver alguns filmes apresentados pelo João Bénard da Costa e pouco mais. E há quantos anos isso foi? Será que alguém ainda se lembra? Até com o exemplo que dás: já nem sequer se dão ao trabalho de ter sessões duplas ao Sábado que tenham no mínimo algo em comum.
Cumprimentos aos cinco e uma vez mais, parabéns pela iniciativa. Acredito, como o Sam e do Pedro Treno, que no futuro estas ideias vão ser pegadas por alguém.
Olá!
Fiz um breve comentário a propósito deste "balanço" aqui: http://www.cineclubefdup.blogspot.com/.
Queira ver, se for do seu interesse. Parabéns pela iniciativa, ainda que - para já - gorada...
Francisco Noronha
Caros,
Como subscritor desta petição acho que este balanço é um péssimo fecho para uma iniciativa louvável:
1- Em vez de procurar uma reunião de esforços procura denegrir e prejudicar instituições ou agentes do sector.
2- Sou sócio e Vice-Presidente da APR e que eu saiba não houve nenhum contacto oficial deste "núcleo" com a APR para agendar alguma acção conjunta. Por outro lado sei que muitos realizadores a subscreveram. E que os ideais de existência de mais cinema de qualidade ao abrigo do serviço público é uma constante luta desta Associação perante a RTP. Também pela presença digna do cinema Português neste canal.
3 - Acho que terminar esta acção (que não estaria terminada) com um texto com incorrecções, incompleto e eivado de demagogia, não enobrece os promotores da acção e perturba os peticionários que se uniram em torno desta causa.
Tratava-se de unir um grupo, um sector alargado (gente que gosta e ama o cinema) e constituir num todo um grupo de pressão, não uma iniciativa louvável de uns quantos promotores em busca de um reconhecimento frustre.
Confirmo o meu desapontamento e enorme decepção pela forma como este texto "fechou" o que parecia ser um esforço louvável.
Solicito que caso seja possível informaticamente retirem o meu nome desta petição.
Sem mais, Fernando Vendrell
A nossa causa não é, nunca foi, aliás, contra quem quer que seja, mas sempre foi uma causa pública, aberta, democrática e que sempre procurou apoios. Não houve nenhum apoio formal - e vários foram os contactos... só mails terão sido dezenas, todos sem resposta - da parte da Associação que representa, nem nada que se pareça. Se não sabia, dever-se-ia informar melhor antes de escrever comentários nesse tom, desculpe-me que lhe diga, também ele "decepcionante".
De qualquer modo, asseguro-lhe que eu sou um signatário como qualquer outro, que formalmente sempre combati única e exclusivamente pelo que está no texto da petição, que o senhor Vendrell assinou, subscrição essa que nós - aliás, eu pessoalmente até - não deixei de destacar penso que convenientemente.
Não "fechei" causa nenhuma com este texto - não tenho a pretensão de o ter feito, nem a vontade ou o poder sequer para tal -; trata-se, antes, do balanço final (um dos vários que tenho feito a título pessoal...) da PETIÇÃO que iniciámos há 11 meses e que há dias entregámos na AR.
Na realidade, se quiser, poderemos marcar um encontro para lançar novas estratégias que tenha em mente - reparo é que, neste caso, talvez tenha chegado algo tarde, tão tarde que já não dá para retirar o seu nome de uma petição que defende o regresso do cinema ao segundo canal. De qualquer modo, sem ironias lhe digo que, com ou sem a sua assinatura, parece-me que a RTP2 está apostada em não ouvir as nossas queixas - é a triste realidade que tentei transmitir neste texto "provocador".
Quanto ao resto - não me quero alongar, porque, afinal, já lá vão mais de 100 posts, dois podcasts, 3 horas de debate, etc... - só tenho a dizer que acho que fui muito completo no balanço que fiz. Demasiado completo? Não duvido que terei sido…
Se cometi incorrecções? Estou certo que todos as cometemos. Se errei ou fui injusto? Talvez. Mas estou a ser o mais sincero que posso, porque penso genuinamente que eu e os meus colegas fizemos tudo. Se acha que a Associação que representa fez tudo, muito bem. Eu penso que talvez pudesse ter feito mais.
Permita-me agora que voltemos à questão fundamental: como tornar esta "luta" mais consequente. Penso que é nesta questão que deverá concentrar as suas energias.
nem apr nem cinemateca ligaram? natural, vocês eram 'só' «bloggers de cinema - nem propriamente os mais "populares", sem nome mediático ou redes de contactos mediáticas...». eis a razão.
parabéns pela iniciativa, que subscrevi.
Fiquei "aparvalhado" com o comentário de Fernando Vendrell, aka Torpedo Master, sobre esta questão.
Na minha óptica, só confirma a suspeita que nutro há muito tempo sobre o funcionamento do cinema português: de mão estendida na esperança que os filmes sejam financiados e sem desejos de levantarem muitas ondas sobre o actual estado de coisas.
E ainda pretendem que nos rendamos cegamente à cinematografia nacional...
Sr Vendrell,
meia-dúzia de pessoas, sem cunhas ou ligações, lançam uma petição, chegam a dois ou três jornais, reúnem cerca de 3 mil assinaturas, chegam inclusivamente à Assembleia da República.
No caminho, pouco apoio, com algumas excepções, de cineastas, nenhum de festivais, associações ou distribuidoras, demasiado presos às suas rivalidades e ao seu autismo para mexerem uma palha.
Nisto, o sr Vendrell acha mal que falemos da falta de apoio que tivemos, pois não teremos feito nada para os grangear. Esquecendo-se apenas do trabalho de pessoas que, sem nada a ganhar que não a eventual satisfação pelo dever cumprido, empenharam o seu tempo nesta iniciativa. Responda então, sr Vendrell, por que motivo não houve qualquer estender de mão da APR para connosco, ou por que motivo, segundo nos fez chegar fonte seguir, a directora da APR, Margarida Gil, assinou tarde e a más horas, por pensar, de forma ridícula, que era o dr. Arons de Carvalho que estava por trás da petição.
Se não o conseguir fazer, ganhe vergonha, que bem precisa.
Miguel Domingues
Nem tudo está perdido. Acredito que a vossa iniciativa não foi em vão e que a médio prazo é capaz de vir a dar frutos - a prova disso é os debates que têm surgido em torno do que é ou não serviço público de televisão.
Quanto ao silêncio de muitas autoridades na área do cinema em Portugal, e ao comentário infeliz do sr. Fernando Vendrell, só serve para confirmar as muitas suspeitas de há muito: que há uma forte promiscuidade na transparência de relações entre cineastas e os poderes por detrás do segundo canal.
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