Se me perguntassem qual a sensação que perdurou, após as intervenções dos deputados, nomeadamente, das Senhoras Deputadas Nilza Sena Santos e Inês de Medeiros, responder-vos-ia em duas partes.
Primeiro dir-vos-ia que ficou claro que estamos todos de acordo (aliás, tanto Nilza Sena, do PSD, como Inês de Medeiros, do PS, subscreveram a nossa petição, o que só demonstra o óbvio de tudo isto). A RTP2 não cumpre as suas obrigações no que a uma programação cultural (de cinema) de "serviço público" diz respeito.
Por outro lado, registamos com algum desalento um pouco aquilo que já tínhamos sentido após a audição parlamentar com o Partido Socialista, realizada por iniciativa da Deputada Inês de Medeiros: apesar de concordarem connosco, os nossos deputados não parecem dispostos (ou dizem-se impotentes) a ultrapassar algumas ideias, a nosso ver, falaciosas em torno dos limites que se impõem à liberdade editorial/programática na televisão pública. Porque, a nosso ver, para haver programação de qualidade, a RTP2 tem de operar mudanças, algumas delas, como se tem visto, face à resistência (teimosia...) demonstrada, muito difíceis (vai-se lá saber por quê...) de tomar pela actual direcção (que não mudou uma vírgula na sua programação desde que esta causa começou, isto é, 3000 assinaturas, três sessões parlamentares, um requerimento parlamentar da Deputada Catarina Martins, vários artigos, podcasts e uma conferência depois).
Todavia, para que a RTP2 opere essas mudanças, a força da sociedade civil não é suficiente. Digo-vos rápido e depressa isto: a RTP2 não quer ouvir o seu público. Para isso pensávamos que havia, pelo menos, a ERC - que basicamente não existiu ao longo de todo este processo - e, em última instância, a Assembleia da República (AR). Aí, confesso, pensei que íamos ganhar outro tipo de embalo, mas isso parece não estar a acontecer. A AR responde com obstáculos e muitos paninhos quentes face a um caso flagrante (estamos todos de acordo aqui) de incumprimento do Contrato de Concessão de Serviço Público e ao alheamento da estação pública RTP2 e ERC em relação aos cidadãos-contribuintes que exigem uma programação de cinema de qualidade.
Qualidade. O que é isso? Um conceito excessivamente subjectivo que torna inviável qualquer tipo de intervenção por parte da Assembleia, porque significa "ingerência" nas decisões programáticas da direcção do canal. Para nós, qualidade é um conceito que está na Lei da Televisão e no Contrato de Concessão, que é objectivável como tal: está escrito que a RTP2 tem de prezar os seus conteúdos, porque só assim se tem uma televisão pública respeitadora do seu público; mais ainda, "formadora" de um público. Ora, há perto de 3000 pessoas que afirmam que essa qualidade efectivamente não existe. Cá está, a nosso ver, algo tão subjectivo e tão objectivo quanto o ser proibido passar-se "filmes de teor pornográfico" nos canais de sinal aberto; tão subjectivo e tão objectivo quanto o não se poder fazer propaganda de extrema direita através de quaisquer meios do Estado - e não só -; tão subjectivo e objectivo como a ausência da publicidade comercial na RTP2. Tão subjectivo e objectivo quanto a Lei, qualquer Lei, o é, apetece dizer, inevitavelmente.
Mas, afinal, o que é "teor pornográfico"? Afinal, o que é "extrema direita"? Afinal, o que é "publicidade comercial"? Cá para mim, é tão subjectivo quanto "uma programação de cinema de qualidade"; é talvez "menos subjectivo" - eufemismo para "arbitrário", para os lados da Assembleia - do que aquilo que parte substancial, e por sinal, bastante informada da sociedade civil reclama como uma programação de cinema de qualidade, do que parte substancial da sociedade civil defende ser um atentado ao contrato que uma empresa pública assinou com o Estado. Mas "corrigir" o incumpridor é ingerir no seu espaço de liberdade? Bem, "ingerir" é o que cabe ao Estado fazer quando este é directamente lesado por alguém, no caso, alguém que dele depende por inteiro.
Ingerir no espaço de liberdade do incumpridor não é um atentado ao Estado de Direito. Pelo contrário: é uma intervenção necessária à manutenção do Estado de Direito. Para o caso, é uma intervenção necessária à restauração da transparência da instituição pública, do Estado, que é a RTP2. Mas todas estas ideias, que à partida não ofereceriam grande discussão, parecem estar a "bloquear" politicamente qualquer acção mais visível por parte da Assembleia sobre esta causa que temos, de facto, como "civilizacional".
De qualquer modo, esperamos ainda que a Comissão para a Ética... procure ter um papel actuante até ao final deste processo. É isso, enfim, que todos nós esperamos dos nossos representantes: soluções e não obstáculos. Vamos ter fé...
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