sábado, 18 de maio de 2013
Cinemateca Portuguesa: por uma direcção mais efectiva
O requerimento elaborado pelo grupo parlamentar do PCP sobre a "Situação da Cinemateca" parece ter tudo lá dentro, até conta com frases de algibeira tão habituais como "reais intenções da política de direita". Não duvido da seriedade de quem elencou o que está em falta e o que deve ser feito, mas não posso deixar de notar a ausência aqui de um objectivo fundamental, que é garantir que, mesmo com o dinheiro pedido, a Cinemateca não volte a cair, ou melhor, a decair na sua missão e na sua imagem. É que - como adiantei aqui - o início da derrocada remonta pelo menos aos tempos do governo anterior, cujas reais intenções tinham supostamente sinal político contrário...
Na minha opinião, só repensando o modelo de sustentabilidade da Cinemateca é que se pode assegurar o futuro desta magnífica instituição. Para tal, quanto menos Estado e mais autonomia, melhor. A negociação com o Estado deveria talvez ir por aí - e o documento do PCP aborda já esta questão, quando refere formas alternativas de obtenção de receita -, face até à monstruosa quantidade de problemas acumulados ao longo do mandato desta direcção, problemas que neste momento fragilizam enormemente, ainda para mais na actual conjuntura político-económica, a imagem pública da instituição. Aliás, assiste-se hoje não à indignação geral, mas à quase total apatia da sociedade civil, começando logo pelos utentes e amigos da Cinemateca. Despejam-se uns comentários levianos - como "bandidos" ou "gatunos" - no Facebook, diaboliza-se a governança - quando a situação vem já do governo anterior e quando já vamos no segundo secretário de Estado da Cultura - e segue-se alegremente, dançando e cantando.
Penso que para haver uma mudança de facto consequente, que retire de vez a Cinemateca desta morte lenta, essa restruturação tem de ser iniciada para lá da actual direcção. Na realidade, e isto pode parecer paradoxal, as funções da direcção deveriam ser mais escrutinadas e, logo, politizadas. Sabemos que a sua nomeação é política - efectuada directamente pelo executivo - mas no exercício das suas funções eu, enquanto utente e amigo da Cinemateca, não encontro qualquer forma de responsabilização ou, usando uma palavras mais cara, accountability, até porque não sei - ou não posso concretizar - que valores e critérios presidem a tal nomeação ou o que move o nomeador nessa escolha - podemos nem saber ao certo quais as "ideias de cinema" que irão nortear o(a) director(a) que aí vem.
Face à crise identitária que assola a Cinemateca desde o desaparecimento de João Bénard da Costa, talvez se justifique voltar a pegar na proposta avançada por João Mário Grilo pouco tempo antes da escolha da actual directora. A futura direcção deverá ser escolhida por concurso público, onde se discutam não só pessoas e ideias de cinema, mas também projectos de viabilização político-económica da instituição. Claro que, para tal, seria necessário provocar, desde já, o debate político e, sem medos, antecipar a dissolução da actual direcção.
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2 comentários:
Spot on.
Realmente, incomoda-me imenso que este género de "interpelação", sobre a situação actual da Cinemateca Portuguesa, tenha sempre iniciativa da oposição partidária ao Governo.
Depois da iniciativa do Bloco de Esquerda (que não encontrou continuação nem resultados posteriores), agora o PCP. E, muito possivelmente, com o mesmo desfecho.
Urge, sem dúvida, debate político. Mas o público afigura-se muito mais primordial.
Cumps cinéfilos.
Sem dúvida. Debate público sobre novas políticas futuras que nos assegurem o futuro da Cinemateca tal como a conhecemos, é isto que falta actualmente.
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