sexta-feira, 21 de março de 2008

Young Mr. Lincoln (1939) de John Ford

Antes de mais, convém contextualizar historicamente "Young Mr. Lincoln": ano de 1939, ou seja, na Europa estala a II Guerra Mundial e, nos Estados Unidos, campeia um sentimento culpabilizante de impotência e desilusão, escudado pelos tradicionais pressupostos da sua política isolacionista.

A guerra não era, ainda, um problema que pusesse em causa a unidade interna do país, que apenas fora interrompida, entre 1861 e 1865, com o decurso da sangrenta guerra civil norte-americana; era, antes, o catalisador de um sentimento misto de culpa e insegurança que acometia a opinião pública norte-americana, a mesma que, no fim da I Guerra Mundial, decidiu pressionar o Congresso a chumbar o Tratado de Versalhes, isto é, a paz que ela própria ajudara a conquistar, aqui, na Europa. É que os Estados Unidos são uma democracia relativamente sólida desde Lincoln e do trauma fratricida e, nela, o povo, e o seu mood oscilante, determinam o curso da política externa.

Foi importante, para os criadores desse tempo, recuperar os grandes símbolos da mais velha democracia do mundo, reafirmando-a, como forma de resistência firme - ou contra-propaganda? -, em face da perversa mudança que operava no outro lado do Atlântico. Com "Young Mr. Lincoln", mas também com "Mr. Smith Goes to Washington", dois clássicos de 1939, ressuscitava-se Abraham Lincoln, o Presidente perseverante e humanista que lutou pela unidade do país durante a guerra civil e que, por isso, foi morto.

O filme de Ford centra-se nos primeiros anos de Abe Lincoln, já o de Frank Capra homenageia uma certa "ideia de Lincoln". No primeiro, encerra-se um gesto deificador do homem e político; no segundo, eleva-se tudo aquilo que a ideologia democrática representa e que, aos olhos do protagonista, se sintetiza na figura de Lincoln. Capra é um realizador que põe as suas personagens a sonhar - e nós com elas -, mas não filma com a sofreguidão de Ford.

Todavia, não nos equivoquemos, "Young Mr. Lincoln" é tão propagandístico como "The Great Dictator" (1940); é tão carregadamente simbólico (a analogia rio/passagem do tempo ou o anúncio trágico dos céus, nos últimos instantes) como os filmes de Sergei Eisenstein, realizador que um dia, sobre "Young Mr. Lincoln", disse: "de entre todas as obras que possuem uma harmonia quase clássica, esta ocupa o lugar de honra" – neste caso, não é a mensagem, mas a força intemporal da Arte que os une.

As imagens que produziram - e que, no caso de Ford, atingem o seu pico neste filme - são a expressão mais harmoniosa, radical para o seu tempo, de uma linguagem universal, capaz de esmagar qualquer opúsculo ideológico arcaizado pelo tempo.

No entanto, John Ford foi dos poucos cineastas a conquistar uma espécie de simplicidade divina, fazendo do plano fixo, por vezes distante, misterioso e perscrutador (exemplo da incrível sequência do homicídio), um canal privilegiado para o seu génio.

Ler mais aqui: IMDB e Midas.

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