Uma coisa é certa: a bola é redonda e no início há onze contra onze. Tudo pode acontecer, o futebol é assim mesmo.
Agora que o campeonato nacional de futebol já começou, voltam com ele os inenarráveis talk shows desportivos com os habituais comentadores (parciais e assumidamente facciosos) a representar cada um dos três grandes. O programa "O Dia Seguinte" é, de longe, o mais degradante produto televisivo dentro deste formato de abominável celebração fanática e fascizante do "desporto-rei" - por sinal, um rei absolutista... Há séculos que este programa mantém um formato quase inalterado e o mesmo painel - só há um ou dois anos o comentador do Benfica, Fernando Seara, mudou-se para a concorrente TVI 24.
Se há modelo, de facto, fascista de televisão é este: três adultos, "vendidos" como homens sérios - veja-se como gostam de puxar dos seus galões de juristas - defendem com argumentos de bradar os céus cada um dos seus clubes - como se fosse uma questão de vida ou de morte. As insinuações mais gravosas são feitas de forma genérica ("o sistema...", "eles") e intelectualmente infantil (cada comentador faz, por programa, a sua birra) sem que haja, da parte do "jornalista" moderador, qualquer tipo de pedido de esclarecimentos ou tentativa de elevar o debate dentro dos possíveis - no caso, muito, mas muito pelo contrário.
O contraditório é falsificado, porque todos eles dizem, todas as semanas, as mesmas coisas, repetem ad nauseam os mesmos disparates, lançam as mesmas insinuações criminosas (principal alvo: os árbitros, claro...) e entram nas mesmas discussões vazias em torno do "se não ganhamos, empatamos ou perdemos" e outras tiradas absolutamente néscias que tão ilustres juristas/políticos (por acaso, sobretudo, de direita) vomitam todas as segundas com a soberba de quem se julga muito inteligente e mordaz -- e, o que sinceramente me deixa de queixo caído, corajoso! Mordaz e corajoso, no mundo do futebol, é pensar-se pela própria cabeça e fazer-se comentário a milhas da "clubite aguda", que só instiga o ódio e o pensamento selvagem (o anti-benfiquismo, o anti-sportinguismo, o anti-portismo...).
Ouvir um destes senhores a chamar "corrupto", imputar actos de corrupção a dirigentes e árbitros é o pão nosso de cada dia. Mas pior são os raciocínios circulares em torno dos lances de arbitragem polémica: todos defendem a respectiva cor perante a "EVIDÊNCIA" das imagens, mas todos convergem numa coisa (esta é a birra que os une): os árbitros são parciais, não se sabe bem por quê, nem se sabe se DE FACTO são, mas são, porque erram "de propósito". Bem, então, se é assim tão EVIDENTE, porque é que tão ilustres senhores (e são juristas, minha Nossa Senhora do Caravaggio!) têm tantas dúvidas ou divergem tanto nos juízos que fazem a cada lance, mesmo através de mil repetições, em mil posições de câmara diferentes e em slow motion? Haja paciência! Parem com insultos à inteligência do espectador!
Pena que este modelo "arena" tenha contaminado o debate político, na Assembleia e/ou na Televisão. Cada vez há mais programas de debate político com representantes das forças políticas com acento parlamentar. A TV pública defende-se com o dever de pluralidade, mas que pluralidade há numa conversa onde ninguém está disposto a ouvir, onde todos têm o dever - e ai de... - de seguir a sua agenda partidária? Onde estão os valores da independência e da mínima decência moral e intelectual, senhores da televisão?
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