sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Scream 4 (2011) de Wes Craven


"Scream 4" é o "meta-meta-horror movie"; jogo de espelhos-dentro-de-outros-espelhos que só termina verdadeiramente quando o filme acaba - não! nem aí ele termina... De qualquer modo, é no início que ele nos deixa quase sem palavras perante a desmultiplicação do espaço fílmico em remakes sucessivos, isto é, variações sobre a mesma ideia que se tornou, desde o primeiro "Scream", imagem de marca dos slasher movies de adolescentes: gajas boas a trocar impressões sobre filmes de terror - em discurso sofisticado que obviamente "não lhes pertence"... isto é, discurso que é mais de Craven do que das personagens... - e um gajo de voz rouca que resolve atormentá-las com telefonemas ameaçadores - já agora, a pergunta "qual o teu filme de terror preferido?" não é bem retórica aqui... Mas não vou entrar por aí neste breve comentário. Os clichés aqui são dinamitados discursivamente, o que só torna "redundante" qualquer desconstrução da mesma natureza - "ponto a ponto" - que eu possa fazer.

Se me permitem, não fugindo ao filme e ao lugar que ocupa na série, salto para os minutos finais, em que se dá uma inversão de papéis curiosa: Sidney (a "heroína" interpretada desde o primeiro filme pela "estrela cadente dos anos 90" Neve Campbell) ouve do assassino (que não vou obviamente revelar aqui) um desabafo desconcertante. "Don't you die? Are you Mike Myers or what?" É a partir daqui que "Scream 4" dá a volta ao jogo: de facto, para frustração do público farto de franchises repetitivos, sem fim à vista, Sidney não desaparece de uma vez por todas... Ora, a regra nos slashers é que a única "coisa" que não desaparece é, por norma, o assassino (Myers, Jason, Krueger, Leatherface, etc.). Em "Scream", Sidney é o ser supranatural que resiste à morte, redireccionando o massacre para todos os que a rodeiam - se virem, apenas duas personagens a acompanham na sua vida (a jornalista e o xerife), as suas outras companhias vão alimentando, como carne para canhão, os banhos de sangue que cada filme tem reservado ao espectador.

Nesta quarta parte, cheia de metadiscurso delirante sobre a gramática do cinema de horror (muito mais inteligente que o da terceira parte, diga-se), Sidney é mais literalmente assumida como primeira - e última? - fonte do mal; a sua solidão, no final de cada filme, é o tal sinal de que, por muito boazinha que seja, ela desperta o pior que há nos que a rodeiam. Sidney está amaldiçoada, mas é ela, na sua carreira de "vítima profissional" levada ao paroxismo, que mantém o filme e o filme dentro do filme, os "Stabs" nos seus vários remakes... , vivos, eterna e renovadamente vivos. Por isso, numa tirada genial no final de "Scream 4", ouvimos da boca de Sidney esta frase penetrante dirigida ao "assassino": "You forgot the first rule of remakes (....): Don't fuck with the original!" Esta frase significa isto: "Don't fuck with the original, let the original fuck with you". O "original" aqui não é "Scream 1" mas Sidney/Neve Campbell, a imparável "motherfucking surviver" que, já se percebeu, é o principal - e verdadeiramente único - grande vilão da série, nem que fosse porque sem ela não haveria gritos de morte em cada novo capítulo deste livro eternamente deixado em aberto.

Craven é ás a manobrar este discurso pós-moderno à la matrioskas, como bem sabemos do subvalorizado último filme de "Pesadelo em Elm Street" realizado por si, "New Nightmare". Neste "Scream 4", sem perder a ironia, por assim dizer, "afiada" que caracteriza alguns dos melhores momentos da sua carreira, Craven recicla em controlado (ou controladamente descontrolado) registo auto-paródico a história de Sidney, colocando a heroína a braços com um problema que deve ser muito chato para qualquer heroína, mesmo por muito pouco "clássica" que esta seja: o de passar a se constituir, enfim, como a principal "empresária" do mal ou, usando um termo mais "cinematográfico", a grande "realizadora" do horror, no sentido em que o torna possível tal como no sentido em que "orienta" a sua acção. Mais um puzzle que Craven, se calhar, saberá, para surpresa do mundo, como "resolver" num eventual quinto filme da série.

4 comentários:

Carlos Natálio disse...

Quinto episódio?? O metadiscurso não faz milagres.. Podia ser é a Neve Campbell numa asilo estilo Shock Corridor ou assim.

Luís Mendonça disse...

A avaliar por todos os quatro que já lá vão, tendo em conta óbvia qualidade dos dois primeiros e, a meu ver, a surpreendente inteligência deste quarto, acho que Craven conseguirá surpreender-nos com um quinto episódio - enquanto houver "filmes de terror", códigos que se repetem..., haverá espaço para os metadiscursos de Craven, seja recuperando a Sidney, seja recuperando o Krueger....

Carlos Natálio disse...

Mas tá confirmado o quinto filme? Se sim, nesse já não me apanham..

Luís Mendonça disse...

Não, não está projectado nenhum quinto, parece-me.

Mas se for relaizaado pelo Craven e escrito pelo Keivn Williamson, então, podem contar comigo como espectador!

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