Aos 12 minutos de "À Meia-Noite Levarei Sua Alma" (1964), Zé do Caixão antecipa uma reflexão de Rancière a propósito de "Histoire(s) du cinéma" de Godard, abrindo caminho a um processo de disjunção, "anti-representativo", entre imagem e palavra, que faz converter a palavra em carne e o corpo da imagem numa encriptação, ou seja, numa forma de escrita... Mas fá-lo incompletamente, como que enunciando apenas um esboço dessa "mudança". Zé do Caixão experimenta empiricamente a possibilidade dos misteriosos lábios de Terezinha (a imagem) serem tão rebeldes quanto as palavras que eles adornam (som e texto). Num filme de som assíncrono, é curioso que Zé do Caixão provoque esta brecha hipotética entre o que a mulher que quer possuir diz e o que os seus lábios (mudos) lhe fazem ver e sentir. A experiência acabará por não correr bem, já que os lábios de Terezinha eram afinal menos rebeldes que os seus dentes, que vão morder até sangrar a boca do "anticristo brasileiro".
Zé do Caixão: Quero ver se seus lábios são tão rebeldes como suas palavras!
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