Diz-me o senhor Wemans: "Mas, ó caro Luís, você que tem a mania que é bom, devia perceber que as razões para a redução do número de filmes na grelha da RTP2 se deve ao facto da maioria do público cinéfilo hoje em dia - sobretudo, jovem - consumir filmes pela Internet, à la carte". Ao que eu respondo: "Certo, isso é uma realidade, mas o caríssimo senhor Wemans também sabe que os meninos e meninas só vão descobrir coisas como Kitano, Tati, Godard, os checos, os tailandeses, os romenos, os filipinos e, levando ao limite o exotismo, os portugueses se alguém lhes der a ver esse cinema. Senão, como explica o sucesso consolidado que é a Cinemateca e o clamor instalado para que se abram filiais da mesma em vários pontos do país? Há fome de cinema, o cinema está acessível na Internet e em DVD, mas falta mostrar o caminho. Esse caminho chama-se, a meu ver, "serviço público". E é dever da RTP2 desbravá-lo e guiar-nos na viagem".
Face a esta resposta, o senhor Wemans riposta rapidamente com um "Epa, mas tu pensas que se retomássemos uma programação intensiva de cinema as pessoas iam ver? Elas têm imensas alternativas hoje em dia, com os canais temáticos de cinema do Cabo. Nós não conseguiremos fazer frente a tal concorrência". "Concorrência?", isto sou eu, "Mas já passou os olhos por esses canais? São listagens caóticos e aleatórias de filmes acabadinhos de sair das salas, muitos deles, de qualidade duvidosa e que interessam pouco a este "público alvo", termo que seguramente aprecia e que aplico aqui para cair nas suas boas graças...Claro que, aqui e ali, passam filmes raros ou interessantes, mas aparecem descontextualizados, sem o enquadramento que, por exemplo, a Inês de Medeiros e os seus convidados faziam em "Filme da Minha Vida" ou das extraoardinárias apresentações de Bénard da Costa".
"Luís", diz Wemans - mas ele sabe quem eu sou, eu, um mero mortal? -, "O que diz faz algum sentido, mas é totalmente irrealista, sobretudo, nesta conjuntura internacional de crise. Tudo isso sai caríssimo". "Sai?", returco eu, "Mas não está a sair muito mais caro um talk show em directo todas as noites? Ou um magazine cultural que padece do paradoxo do Ornitorrinco (é um programa de entrevistas? É um magazine cultural? É temático? É generalista?)? Ouvi dizer que bom dinheiro tem sido investido nestes "conteúdos", outra palavra que decerto apreciará, o que é muito pouco visível no resultado final, inclusivamente em termos de "share" - ui, outra. Também não se pode dizer que seja uma política financeiramente equilibrada investir em documentários/filmes que depois não promove, ou promove mal, ou/e não divulga no seu canal".
"Luís", de novo Wemans - mas que confianças são estas? Ele conhece-me de algum lado para me tratar pelo primeiro nome? -, "Tudo bem. Nós temo-nos desleixado um pouco, mas olha fica descansado que eu irei reflectir sobre esta conversa. Terei em conta as queixas que me transmitiste".
"Obrigado", respondo.
Afinal o Wemans até é um gajo porreiro.
ATENÇÃO: esta conversa é pura invenção minha. Não aconteceu mas podia ter acontecido - só teria, se calhar, outro desenlace. Juntem-se a nós para incluirmos alguns destes argumentos numa petição pública por uma RTP2 com uma programação de Cinema.
4 comentários:
Falaste com ele agora já depois desta ideia da petição?
Ah não, isto é uma brincadeira!
ehhehe, bem me parecia, era para confirmar.
Quanto aos argumentos que possam ser adiantados da crise e dos hábitos dos consumidores no acesso à net, estes são puramente circunstanciais. Além de que não justificam a inacção de quem está numa posição de poder como o director de programação de um serviço público.
Quanto à concorrência, bom, um serviço público não pode agir como um concorrente dos morangos com açucar. Senão não era...serviço público.
Quanto ao facto de ter pouco público uma iniciativa destas também não é justificativo. Terá por certo mas com os indicadores de qualidade e habituação esse público "cria-se". Como aconteceu, aliás, com o "5 noites 5 filmes", o "Bouillon de Culture" em França ou o brilhante magazine cinematográfico "Fuori Orario" de Enrico Ghezzi em Itália.
Eu acho que uma iniciativa/petição destas tem de demarcar-se de uma vontade meramente saudosista de trazer os bons velhos tempos do "5 noites 5 filmes" mas sim, integrando todos os elementos circunstanciais do que é ver cinema hoje em 2010, pensar num projecto razoável e de qualidade para o futuro.
Abraço,
Concordo contigo a 100% quando dizes que nos devemos demarcar de uma perspectiva saudosista. Aí a redacção do texto da petição tem de ser cuidadosa, rementendo para o passado apenas como referência ou a título de exemplo. De qualquer maneira, o que penso que devemos reivindicar é simplesmente isto: uma programação de cinema que preencha os requisitos de qualidade do serviço público.
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