segunda-feira, 29 de julho de 2013

Centro Histórico (2012) de Aki Kaurismaki, Pedro Costa, Victor Erice e Manoel de Oliveira


Os filmes colectivos são sempre projectos arriscados e na maior parte das vezes o todo é inferior à soma das partes. Em parte, esse é o caso deste "Centro Histórico", uma produção Guimarães 2012 que junta "à mesma mesa" Aki Kaurismaki, Pedro Costa, Victor Erice e Manoel de Oliveira. Nenhuma das curtas que realizam consegue mais do que constituir uma pequena e doce vírgula nas suas carreiras. O filme de Erice, o único inequivocamente documental, é aquele que, em mim, sobressai pela sua força emocional. Depois de umas não particularmente bem encenadas "cabeças falantes", o filme toca o sublime numa sequência inteira onde a música de um acordeão banha, com uma inesperada pungência, uma fotografia muito antiga dos trabalhadores da Fábrica de Fiação e Tecidos do Rio Vizela. A galeria de rostos devastados por uma vida de miséria e sacrifício é percorrida pela câmara de Erice e o acordeão de um homem ligado, pelos laços de sangue, à história centenária dessa fábrica que chegou a ser uma das maiores do ramo têxtil em todo o mundo. Sobre essa "imagem da foto", anima-se um verdadeiramente pungente sentimento de morte, tristeza, desolação...

O filme de Pedro Costa ("Sweet Exorcist") volta a ter no centro a personagem de Ventura, adensando os vários fantasmas que o habitam, sobretudo, a Revolução de Abril e a mulher querida que nunca mais vê ao seu lado, vinda de Cabo Verde. Tudo indica que esta curta serviu de esboço para a próxima longa-metragem de Pedro Costa. Ainda assim, o termo "esboço" é traiçoeiro dado o rigor de cada plano, a estranha conceptualização (talvez demasiado "artificiosa" para um filme de Pedro Costa) do diálogo alucinado entre Ventura e a estátua viva de um militar de Abril. Longe da obra-prima "O nosso Homem", este é um exorcismo que talvez ganhe um novo sentido com a anunciada nova longa de Pedro Costa. Outro sentido, contudo, pode-se já desvendar na relação deste filme com o de Manoel de Oliveira. Se antes tínhamos o militar revolucionário, agora temos a estátua de D. Afonso Henriques, animada com uma mui fina ironia pela câmara de Oliveira.

O primeiro conquistador, aponta Oliveira, é agora conquistado/capturado todos os dias pelos magotes de turistas que compulsivamente o fotografam. O "guia" que dizia "eis isto", virará "comentador" do que se está a passar, afirmando, num desabafo jocoso, "eis disto!". Deixo para o fim o menos conseguido destes filmes: o apenas amenamente divertido e enternecedor, quando quasi-tatiesco, filme de Aki Kaurismaki. Menos conseguido, talvez, mas de modo algum um mau filme. Aliás, nenhum dos quatro filmes parecem querer ir para lá do "filme-teste" (Erice e Costa) ou da piada inteligente (Oliveira). Kaurismaki conta uma estória, encena o seu burlesco deadpan colorido, um gesto que diríamos ser automático não tivesse este como cenário a nossa cidade berço.

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